11 de julho de 2011

"BALAS QUE NÃO ERRAM" (No Name on the Bullet) - AUDIE MURPHY, O PISTOLEIRO MORTAL


Lembro-me de um anúncio numa revista em que o anunciante procurava por filmes de Audie Murphy, o que é estranho pois o famoso maior herói norte-americano da II Guerra Mundial fez muitos filmes esquecíveis, além de ser lembrado por suas limitações como intérprete. Porém na extensa filmografia de westerns de Audie Murphy alguns títulos merecem ser olhados com mais atenção. Um deles é “Balas que não Erram” (No Name on the Bullet), de 1959. Contratado da Universal Pictures, Audie fazia westerns num ritmo admirável, numa média de três por ano para a alegria dos fãs de faroestes. A qualidade de seus filmes pareciam estar intrinsecamente ligada ao diretor e no filme em questão, “Balas que não Erram”, a direção coube a Jack Arnold, criador de alguns clássicos de ficção-científica. São de Arnold “O Incrível Homem que Encolheu”, “O Monstro da Lagoa Negra”, “Tarântula”, “A Ameaça que Veio do Espaço”, comprovando ser ele um prestigiado diretor de filmes modestos que resultaram em excelentes trabalhos. Jack Arnold incursionou pelo western também com “Caravana da Morte” (The Man from Bitter Ridge), com Lex Barker; “Onde Imperam as Balas” (Red Sundondown), com Rory Calhoun; e no western-moderno “A Soldo do Diabo” (Man in the Shadow), com Jeff Chandler. Ao se encontrar com Audie Murphy, Jack Arnold realizou seu melhor western e possivelmente o melhor filme de Audie Murphy no gênero.

O PISTOLEIRO DA MORTE - John Gant (Audie Murphy) surge na cidade de Lordsburg e é reconhecido como um pistoleiro de aluguel que tem um modo especial de agir. Gant, que conta 23 mortes em sua lista de trabalho, sempre atira em legítima defesa, o que impede que seja preso como criminoso. O boato da presença de Gant se espalha rapidamente e o povo da cidade entra em pânico sem saber quem exatamente o pistoleiro pretende exterminar. Cada cidadão de Lordsburg tem algum tipo de erro cometido no passado o que leva cada um deles a se preocupar e entender que será a vítima de Gant. A Lei, representada pelo xerife Buck Hastings (Willis Bouchey) tenta inutilmente expulsar Gant da cidade. A histeria coletiva chega a tal ponto que todos os homens da cidade se unem e exigem que Gant vá embora, mas Gant os enfrenta e permanece amedrontando a quase todos. Só o Doutor Luke Canfield (Charles Drake) e seu pai Asa Canfield (R.G. Armstrong) não temem Gant e até simpatizam com ele tentando descobrir quem ele intenta matar. Um banqueiro desesperado se suicida acreditando ser ele o homem visado por Gant. Os fatos chegam ao conhecimento do idoso juiz Benson (Edgar Stehli), homem muito doente, inválido e sem maiores esperanças de vida e que no passado condenou muitos homens à morte. Quando Gant e Benson se encontram, o velho juiz consegue se levantar e tenta disparar contra Gant, porém seu coração fraqueja e o juiz cai morto. Gant ainda se defronta com o Doutor Canfield antes de deixar Lordsburg. Tanto Gant quanto Canfield saem feridos porém não mortalmente, com ambos seguindo seus destinos.

UM WESTERN MÓRBIDO - Essa história de autoria de Howard Amacker é uma fascinante alegoria sobre a morte. O per-sonagem de Audie Murphy (Gant) está sempre vestido com roupas escuras, deixando claro nas poucas palavras que profere que executará seu trabalho. Gant dialoga somente com o Doutor Luke Canfield chegando mesmo a jogar xadrez com ele. No jogo da vida Gant deve matar alguém (o juiz Benson) enquanto Canfield é quem usa seus conhecimentos para manter o velho juiz vivo. Gant diz a Canfield: “Os juízes me interessam pois eles têm o poder sobre a vida e a morte. E os médicos também”. O Doutor Canfield é médico e ainda veterinário, cuidando dos cavalos no estábulo de seu pai. Gant quando surge nos arredores de Lordsburg é recebido com hostilidade por um cão que parece perceber o perigo que o homem de roupa escura e cavalo negro representa. “Balas que não Erram” tem algumas semelhanças com “Matar ou Morrer” (High Noon) quando mostra a covardia que impera na cidade. Em uma das cenas o ajudante do xerife recusa-se a ajudar o xerife e entrega sua estrela, assim como ocorre no filme de Zinnemann. “Balas que não Erram” é igualmente claustrofóbico com a maior parte das cenas se desenrolando no hotel denominado “Soledad”, onde Gant se instala. Assim como no clássico estrelado por Gary Cooper, este western de Jack Arnold é bastante conciso e ainda assim delineia com perfeição o número grande de personagens, seus dramas pessoais e o medo que todos têm do inevitável ajuste final.


AUDIE MURPHY, FRIO E CÍNICO - Jack Arnold reduziu ao mínimo as falas de Audie Murphy no filme. E como ator principal Audie aparece menos na tela que Charles Drake e os outros atores. Estes têm sequências tensas e intérpretes coadjuvantes como Willis Bouchey, Karl Swenson, Warren Stevens, Virginia Grey, Whit Bissell e o próprio Charles Drake dominam praticamente todo o filme dividindo as cenas mais importantes. O personagem de Audie a tudo assiste. Arnold, que costumeiramente trabalha com atores de segundo escalão, soube conduzir a interpretação de Audie Murphy sem exigir dele maior dramaticidade, o que poderia comprometer “Balas que não Erram”. Ainda assim Murphy é inconvincente como um pistoleiro cínico, frio e calculista, com seu diminuto tamanho e eterna cara de adolescente. Também importante foi a atmosfera soturna criada por Jack Arnold. Enquanto a Universal concebeu o western em esplendorosos Technicolor e Cinemascope, Arnold apenas na cena de abertura mostra um grande espaço aberto utilizando esses recursos. “Balas que não Erram” é um western diferente, resultando em brilhante estudo psicológico do comportamento humano diante da iminência da morte, que como diz John Gant: “Todo mundo tem que morrer de qualquer jeito”.

4 comentários:

  1. Fred Zinneman fez de Matar ou Morrer um filme mórbido e, para dar mais autencidade ao que desejava mostrar e conceber, fez a fita em P&B.
    E está aí a unica coisa que Arnold não fez em Balas Que Não Erram, que seria fazer a fita sem cores, em P&B. Possivelmente não por seu desejo, mas sim pela Universal desejar jogar o seu magnifico technicolor nos olhos ávidos dos fãs de Audie Murphy. Não sei ao certo. Mas o tiro teria sido dado melhor sem tantas cores.
    O bastante razoável Arnold fez uma boa fita, deu à mesma um clima vigorosamente denso, não deixou Murphy estragar sua idéia lhe dando muitas falas e levou para as telas um tema muito pouco explorado em westerns.
    Já havia elogiado o Arnold no agradável e bem realizado Onde Imperam as Balas, onde também, Rory Calhoon, que também não se podia deixar à vontade, fez um bom trabalho. De forma que nosso Arnold fez alguns filmes que não devemos ou podemos esquecer (já citados por nosso editor), mas eu considero seu melhor momento em A Soldo do Diabo, um filme onde ele, além de novamente ter um bom e fazer Chandler ser ator de fato, mas desta vez soube dar o complemento que o enredo desejava, utilizando o P&B na sua realização.
    E quando Spielberg, que não considero uma das grandes maravilhas da cinematografia, pois fez muitas coisas ruins, claro que dentro de minha concepção, fez A Lista de Schindler em P&B, eu ouvi muitos comentários sobre esta suposta deficiencia na extraordinária fita. Porém, está
    aí o maior trunfo do diretor; o P&B calcificou a fita de uma forma tão magnificamente real, forte e realista, que de outra forma A Lista de Schindler não seria o sucesso que foi e nem lhe daria o Oscar, que já merecia desde Contato Imediato de 3o.Grau.
    Às vezes ficam em pequenas escolhas, ou direções, o bom rumo de uma fita a partir da decisão acertada de um diretor em abrir mão da tecnologia e fazer uma realização sem muitas invenções, ou qualidades, e que não arrastaria o trabalho final num trabalho de mais superlatividade sem tais segmentos.
    Este seria o caso de Balas Que Não Erram, unico queda nesta boa produção.
    Senão, respondam para mim; quem conceberia O Falcão Maltez ou Casablanca coloridos?
    jurandir_lima@bol.com.br

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  2. Gosto muito desse filme. Gosto tanto a ponto de colocá-lo em meu Top 20. Adoro esses westerns "b", sem pretensões, rodados com poucos recursos mas muita inventividade e estórias fora do rotina.
    Sem dúvida é o melhor westerns com o Audie Murphy. A grande sacada do filme é trabalhar com a questão da culpa e do medo. Todos têm um erro ou pecado a ocultar e a presença do pistoleiro interpretado por Murphy faz com que todos sintam-se inseguros por por tais máculas do passado.

    Com tantas refilmagens desnecessárias atualmente, surpreende-me que esse roteiro nunca tenha sido refeito em um grande filme. Nas mãos de um grande diretor, de uma pequena pérola, que é esse belo western, poderia-se obter uma obra-prima

    Edson Paiva

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  3. Edson Paiva;

    Uma boa sacada esta sua em se fazer uma refilmagem de Balas Que Não Erram. Mas, somente se tal trabalho cair nas mãos de um diretor de qualidade, como um Ridley Scott, p/exp.. Porém, se for para fazeram uma refilmagem como fizeram com Matar ou Morrer, onde desfiguram completamente a obra de Zinneman num besteirol chamado A Vingança de um Pistoleiro, com Tom Skerritt fazendo o papel de Gary Cooper, ou de Galante e Sanguinário, que Russel Crowe interpretou o papel que foi de Glenn Ford em Os Indomáveis, é melhor pra nós, amantes do bom cinema, que fiquemos apenas nos originais.
    Abraço/jurandir_lima@bol.com.br

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  4. Concordo com o que foi comentado, porém, acredito que nada alteraria se o filme fosse em cores ou em preto e branco, o que importa é a concepção. Já revi filmes que foram originalmente feitos em preto e branco e posteriormente colorizados, os quais não perderam a qualidade e alguns ficaram melhores como p.ex. “Rio Vermelho” (Red River), “Rio da Aventura” (The Big Sky), os de Cecil B. De Mille e alguns outros. Na verdade, os filmes das décadas de 40 e 50, a grande maioria era em preto e branco por razões econômicas e não artísticas.

    Quanto ao filme “A Bala Que Não Erra” (No Name on the Bullet) de Jack Arnold, eu considero junto com “O Incrível Homem Que Encolheu” (The Incredible Shrinking Man) e “O Monstro da Lagoa Negra” (The Creature From The Black Lagoon) os seus melhores filmes, embora, os outros por ele dirigidos podem ser considerados de qualidade superior. No entanto, não concordo com a referência de que a interpretação de Audie Murphy nesse filme foi medíocre. Audie Murphy pode não ter sido um grande ator, mas, quando era comandado por um bom diretor (John Huston, Joseph Mankiewicz , Jack Arnold, Donald Siegel, Budd Boetticher, George Marshal) demonstrava capacidade interpretativa como pode-se ver em “O Americano Tranqüilo” (The Quiet American), “O Passado não Perdoa” ( The Unforgiven), “A Glória de Um Covarde” (The Red Bagde of The Courage), “A Quadrilha do Inferna” (Posse From Hell), “Terrivel Como O Inferno” (To Hell and Back),”Antro da Perdição” (Destry), “A Passagem da Noite” (Night Passage) e no filme para TV “The Man”, no qual o seu personagem é um psicopata assassino. Para mim, o que mais importa em um ator é a naturalidade na tela, a credibilidade do personagem por ele interpretado e a capacidade de reação nos momentos em que são necessários.

    A escolha de Audie Murphy para o papel de John Gant, o pistoleiro frio, inteligente, bruto em determinado momento e ao mesmo tempo sociável foi correta porque ele retrata com seu rosto de adolescente aliado à sua estatura (1,65m) a antítese do personagem, que na verdade era ele próprio na vida real, o soldado mais condecorado em combate da 2ª Guerra Mundial onde matou mais de cem alemãs nos campos de batalhas travadas na Itália, França e Bélgica e comandou pelotões com pouco mais de vinte anos de idade.

    É pena que Audie Murphy tenha sido morto aos 47 anos de idade, em um desastre de avião, não tendo a oportunidade de reiniciar sua carreira em filmes como ator suporte, no personagem de um assassino psicopata em “Perseguidor Implacável” (Dirty Harry) a convite de Donald Siegel que o dirigiu em dois filmes anteriormente.

    Sobre sua carreira como ator, ele dizia “Fiz 34 westerns, o meu rosto sempre foi o mesmo, bem como, os diálogos. Somente os cavalos é que mudavam” e “Eu trabalho com uma grande desvantagem.....nenhum talanto”.

    O diretor Budd Boetticher, que o chamava de “o pequeno grande matador”, bem como, John Huston diziam que Audie Murphy tinha grande potencial, só precisava levar a sério ele próprio como ator.

    Mario Peixoto Alves
    peixotoalves@uol.com.br

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