UMA REVISTA ELETRÔNICA QUE FOCALIZA O GÊNERO WESTERN

28 de fevereiro de 2013

O DÓLAR FURADO ENFRENTA O DOUTOR JIVAGO PELO TÍTULO DE CAMPEÃO DE BILHETERIA



Poster original do lançamento
de "O Dólar Furado".
Numa segunda-feira, dia 2 de maio de 1966, os Cines Coral e Windsor, cinemas da já decadente Cinelândia Paulistana, estrearam um faroeste intitulado “O Dólar Furado”. O espectadores menos avisados até podiam acreditar que se tratava de mais um western norte-americano pois os cartazes anunciavam como ator principal Montgomery Wood e como coadjuvantes Evelyn Stewart e Peter Cross. Outros cartazes diziam ainda que aquele era “o maior western de todos os tempos” e que “as mulheres vão gostar e os homens vão temer”. Não poupando superlativos, podia-se ler ainda que “este filme bateu o recorde de bilheteria no mundo inteiro” e de forma mais honesta avisavam que: “Itália vence Hollywood no gênero bang-bang!”. Nessa mesma semana de maio de 1966 quatro importantes cinemas de bairros (Pigalle, Fiametta, Bruni Vila Mariana e Bruni Santo Amaro) também passaram a exibir “O Dólar Furado”, assim como o Cine St. Tropez, na Rua Aurora, cinema que ficava próximo à Av. São João. Em Eastmancolor e Cinemascope, “O Dólar Furado” tinha como diretor Kelvin Jakson Paget, que assim como Montgomery Wood era um ilustre desconhecido para qualquer cinéfilo. Mas não precisou de mais de uma semana para que “O Dólar Furado” se tornasse a principal atração cinematográfica da cidade.


O crítico Orlando Lopes Fassoni.
O.L. Fassoni fala do faroeste italiano - Nessa época o jovem jornalista Orlando Lopes Fassoni era o resenhista de cinema da “Folha de S. Paulo” e escreveu este texto sobre “O Dólar Furado” na página dominical do caderno ‘Ilustrada’ que anunciava os novos filmes: “O argumento deste filme no qual um irmão jura vingar a morte do outro, após terminada a Guerra Civil, não impressiona ninguém. Não existem atores conhecidos e o diretor é daqueles que seguem rigorosamente as ordens da produção. Mas as cores são bem jogadas. “O Dólar Furado” é um dos primeiros da série de westerns que o cinema italiano vem produzindo para concorrer com os norte-americanos. Pode agradar pelo gênero, pela quantidade de tiros disparados e por não conter tanta poeira como no Oeste norte-americano”. O querido Fassoni estava razoavelmente informado ao falar do filme e acertou quando afirmou que aquele faroeste poderia fazer sucesso. Outros exemplares da produção italiana de faroestes já haviam sido lançados no Brasil, embora a palavra western-spaghetti ainda não fizesse parte do vocabulário cinematográfico, como se pode ver pelo texto de Fassoni.

Os filmes de arte do Cine Coral, aquele que apresentava
'sempre um filme excepcional'.
24 semanas no Cine Coral - O Cine Windsor era um dos mais luxuosos da capital paulista e foi inaugurado com o lançamento de “El Cid”, em 1962. Nessa sala “O Dólar Furado” permaneceu três semanas em exibição. Já o Cine Coral, cujo slogan era “Sempre um filme excepcional”, era, de certa forma, o cinema preferido da intelectualidade paulistana. Lá foram lançados “La Dolce Vita” e “Fellini 8 1/2”. O Cine Coral era o espaço no qual eram exibidas as aguardadas semanas de cinema europeu, nas quais a cada dia era projetado um filme diferente. No Cine Coral foi exibido pela primeira vez em São Paulo “O Demônio das Onze Horas” (Pierrot Le Fou), de Jean-Luc Godard. Jamais naquela sala, com quase uma década de existência, um filme conseguira permanecer em exibição por mais de dez semanas, recorde obtido justamente por “La Dolce Vita”. Isso porque o público do chamado 'cinema de arte' nunca foi muito numeroso. Esse recorde de dez semanas foi superado com a longa permanência em cartaz de “O Dólar Furado” devido ao impressionante sucesso de público que lotava o Cine Coral todos os dias da semana, mesmo nas sessões vespertinas. Esse faroeste italiano só foi retirado de exibição no Cine Coral no dia 17 de outubro, após 24 semanas (quase seis meses) de exibição, constituindo-se no faroeste de maior sucesso de todos os tempos na Cinelândia Paulistana.

“Doutor Jivago” enfrenta “O Dólar Furado” - Entre os filmes de sucesso em São Paulo, “O Dólar Furado” teve um rival que foi “Doutor Jivago”, lançado no dia 13 de julho de 1966 no Cine Metro. Um enorme cartaz na frente desse tradicional cinema anunciava a exibição do drama de David Lean que concorreu ao prêmio Oscar em dez categorias, vencendo em cinco delas. O filme “Doutor Jivago” foi levado ao cinema precedido de enorme publicidade pois Boris Pasternak,  autor do livro em que se baseou o filme, havia sido obrigado pelo regime soviético a renunciar ao Prêmio Nobel de Literatura. E Pasternak acabou falecendo pouco depois, em 1960. Em tempos de Guerra Fria esses fatos foram bastante explorados pela imprensa mundial, especialmente pela norte-americana. E o filme “Doutor Jivago” não fez feio pois parecia não mais querer sair de cartaz, sempre no Cine Metro, dando a impressão de estar concorrendo com “O Dólar Furado”. Quando este chegou à 24.ª semana consecutiva de exibição no Cine Coral, “Doutor Jivago” estava na 14.ª semana no Cine Metro. “O Dólar Furado” saiu de exibição e aparentemente “Doutor Jivago” iria ganhar a batalha de maior sucesso de público de 1966 em São Paulo. Mas um fato inusitado, jamais ocorrido em São Paulo e quiçá no mundo todo, estava para acontecer.

Mais dólares no mercado de faroestes - Depois de quase seis meses em exibição numa das maiores e mais respeitáveis salas de cinema de São Paulo (o Cine Coral) e de ser retirado de cartaz, os exibidores ouviram reclamações do público que exigiam o retorno de “O Dólar Furado” aos cinemas. Nesse ínterim, exatamente em 5 de setembro de 1966, foi lançado em São Paulo outro faroeste produzido na Itália que se tornaria lendário. Esse filme era igualmente estrelado por um ator quase desconhecido chamado Clint Eastwood e tinha como diretor um certo 'Bob Robertson'. Intitulava-se, “Por um Punhado de Dólares”. O público fazia comparações entre esse filme e “O Dólar Furado”, discutindo qual dos dois era o melhor. Os bem informados jornalistas, por sua vez, já haviam divulgado que esses e outros faroestes eram diferentes porque produzidos... na Itália, apesar dos nomes ingleses de atores, diretores e técnicos. No dia 3 de dezembro de 1966, quando “Por um Punhado de dólares” já estava na 13.ª semana consecutiva de exibição e “Doutor Jivago” se eternizava no Cine Metro, ocorreu o relançamento de “O Dólar Furado” no Cine Éden. Essa sala exibidora ficava na Avenida São João, próximo ao Cine Metro e a ‘briga’ com “Doutor Jivago” continuou. O filme estrelado por Omar Shariff já estava na 20.ª semana de exibição e “O Dólar Furado” reiniciava sua caminhada de sucesso, agora no Cine Éden, onde permaneceu por mais 14 semanas, totalizando 38 semanas, ou oito meses em cartaz, como se dizia naquele tempo.

Vencedor moral - “Doutor Jivago” encerrou sua carreira com 49 semanas consecutivas em exibição, 47 delas no Cine Metro e as duas últimas no Cine Scala. Foi, certamente, um dos filmes com maior tempo de permanência em exibição em São Paulo. Por sua vez, o bang-bang italiano dirigido por ‘Kelvin Jackson Paget’, se considerado seu custo e a quase nenhuma publicidade que teve, foi o ‘vencedor moral’ desse embate surdo. Nenhum outro faroeste fez tanto sucesso em São Paulo, constituindo um novo público que passou a exigir mais e mais faroestes com aquele estilo, muito diferentes dos norte-americanos. “Shenandoah”, “Juramento de Vingança”, “Os Filhos de Katie Elder”, “Nevada Smith”, “Raça Brava” e outros faroestes produzidos nos Estados Unidos e exibidos naqueles meses de 1966/67 não conseguiam permanecer mais que duas ou três semanas em exibição, enquanto filmes que tinham a palavra 'dólar' no título ficavam semanas em cartaz e sempre com casas cheias. Curiosamente, com raríssimas exceções, a crítica cinematográfica detestava os faroestes made-in-Italy, o que não diminuía a procura do público pelos novos heróis que se multiplicavam com nomes diabolicamente estranhos como Django, Sartana e Sábata.

Semanalmente o público era brindado com faroestes made-in-Italy;
alguns vinham da Espanha.

Orlando Lopes Fassoni, falecido em 2010
em São Paulo, aos 67 anos.
O desabafo do crítico - Já menos simpático com a safra de faroestes europeus, o saudoso Orlando Lopes Fassoni escreveu no caderno ‘Ilustrada’ da Folha de S. Paulo em 24/09/1967, na resenha apresentando “Quatro Dólares de Vingança para Ringo” (I Dollari di Vendetta per Ringo), lançado coincidentemente no Cine Coral: “O western é o mais antigo gênero de cinema, nascido há pouco mais de 60 anos com “The Great Train Robbery” e nele se inclui a própria história dos Estados Unidos, na parte que diz respeito à colonização heróica. Há uma dramaturgia no western norte-americano. Há coerência no desenrolar da história, há o conflito dramático, há o mito. Mas que diabo tem a ver com isso os westerns europeus, os ‘oriundi’? Nada, absolutamente nada. No entanto, eles invadiram o mercado, aqui e além: na Alemanha, na Itália e até nos Estados Unidos. O pior é que a invasão não cessa, porque tem admiradores, atraem, faturam muito (não apenas quatro dólares ou um dólar furado). Esse que entra em circuito é um deles. Como os outros rodados nos campos da Espanha e nos estúdios de Cinecittà, oferece a quem gostar violência gratuita, sem qualquer motivo, e um falso herói do oeste, Ringo. Nenhuma autenticidade, nenhum sentido dramático, nenhum respeito pela coerência fílmica. Uma sucessão de tiros e mortes, com mexicanos no meio, de onde Ringo se sai muito bem. John Ford, Anthony Mann, William Wyler, jamais sonhariam com isso. Italianos e espanhóis contando histórias de Buffalo Bill, de Dodge City, de Forte Apache, do OK Corral, de Wyatt Earp, de Doc Holliday, dos Apaches, dos Cheyennes, do General Custer, de Touro Sentado. Enquanto houver filas para westerns como esses, eles aí estarão. Enquanto renderem ‘um punhado de dólares’, não nos livraremos deles”.  



17 comentários:

  1. Ótima matéria. Eu acho que para saber quem venceu o "duelo" entre O Dólar Furado e Doutor Jivago, o certo seria pesquisar a quantidade de espectadores, não é? Na época, era difícil dizer com certeza, mas com o passar dos anos o que se verifica é que o Doutor Jivago permaneceu em nossas memórias, enquanto O Dólar Furado hoje é só um nome, para a maioria das pessoas.

    Por outro lado, me parece que relançamentos do Dólar Furado já traziam o nome de Giuliano Gemma, não? Aos poucos os italianos foram perdendo a vergonha e assumindo suas verdadeiras origens...

    Um abraço,

    José Tadeu

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  2. Mais uma resenha caprichada e para muitos surpreendente.
    Esta menção da longevidade dos spaghettis em muitos cinemas ao mesmo tempo, já era público e notória e não que passava só em cine poeiras, agora se tem números bem oficiais. Nem só os Italianos perderam a vergonha, bem como muitos ferrenhos "críticos" do spaghetti, que resolveram sair de trás da carroça.
    O Dólar Furado é uma LENDA.
    Doutor Jivago é outra categoria em outro nível, que certamente foi mais visto
    na época, por adultos, com um bom nível intelectual e social.
    Amigão:Dizer que o filme, O Dólar Furado é só um nome, tem alguma coisa furada
    nesta história.
    Joailton-Caruaru

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  3. Concordo plenamente com o Joailton. O Dólar furado é uma lenda e um filme inesquecível, ainda que não esteja no nível de excelência dos de Sergio Leone. O que não gostam de encarar é que Sergio leone não foi apenas melhor que os outros diretores italianos, mas também melhor que quase tudo no cinema mundial do período e muitos westerns não leonianos são realmente bons e até melhores que muitos dos ditos clássicos. Se eliminássemos os westerns de Leone da história ainda assim o gênero se sobressairia com outros como o próprio em questão.Admitem Sergio Leone apenas para recusar os outros, utilizando argumentos sofismáticos. É um fenômeno bem interessante e digno de estudo. No início negavam tudo e até as obras barrocas leonianas foram tidas como lixo estético. Depois foram aos poucos reconhecendo seu talento,haja vista o´Cahiers du Cinema, como se dissessem assim "Vamos reconhecer só esse, os outros não..". Passou-se mais um tempo e resolveram lançar os olhos sobre a obra de Sergio Corbucci. Começam a aceitá-lo, mas ainda com reservas. Reduzem para um.ou no máximo dois, para assim reduzir a importância do gênero na história do cinema mundial.Fazer com que não prestem a atenção nos outros bons. Difundir que existiu apenas um diretor interessante, os outros não, quando na verdade muitos talentos surgiram no período, e um era na verdade não só melhor que seus conterrâneos, mas também melhor que uma dezena de americanos. Admitir um foi duro, admitir dois já foi doloroso e admitir mais outros será insuportável. O dólar furado é um excelente faroeste italiano com um argumento bom e original e tem também uma notável fotografia, com cores bem dosadas e cenas de ação e violência bem filmadas. Para os que dizem que ele é fraco eu gostaria de perguntar onde está o problema, onde ele é fraco. Porque ele fraco? Onde está a fraqueza de seu argumento e em que ele se fundamenta? Onde está o problema em seu roteiro? Será que é fraco simplesmente porque não foi realizado em Hollywood?

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  4. Aprigio, o fato de um filme ter se tornado 'uma lenda' como você diz e ter feito muito sucesso, não implica necessariamente que ele seja nenhuma obra-prima. "Os Dez mandamentos" deve ter batido todos os recordes de bilheteria no Brasil e pode ser chamado também de um épico lendário. Nem por isso o filme de DeMille entra em alguma lista dos melhores.

    A questão de um filme ser 'inesquecível' é bastante relativa pois uma película que pode ser inesquecível para alguns pode ser perfeita e facilmente esquecível para outros.

    Num país que tem a a indústria cinematográfica como uma de suas forças econômicas, como os Estados Unidos e que produzia centenas de filmes anualmente nas décadas de 60 e 70 (que foi o tempo de Sergio Leone), claro que havia mais de uma centena de diretores e nem todos possuíam a qualidade dos grandes mestres dos filmes em língua inglesa radicados nos EUA.

    Pergunto a você: será que Sergio Leone está entre os cinco maiores diretores do cinema italiano? Terra que nos deu De Sica, Monicelli, Fellini, Germi, Antonioni, Visconti, Rossellini, Zurlini, Rizzi, Tornatore, Bertolucci, Scolla, Tavianis, Pasolini e outros?

    Creio que Leone está para o western-spaghetti assim como John Ford está para o faroeste norte-americano. A diferença é que se excluirmos os westerns que John Ford fez, ainda assim poderão ser relacionados dezenas de excepcionais faroestes. O mesmo, me parece, não pode ser afirmado em relação aos westerns europeus até porque o número produzido foi infinitamente menor e restrito a pouco mais de dez anos.

    Darci Fonseca

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  5. Vamos questionar alguns argumentos:
    1- "não implica necessariamente que ele seja nenhuma obra-prima".
    -Onde ficou implícito que o Dólar Furado é uma obra prima? Quem em sã consciência vai querer tal coisa?.
    -Um filme sempre é feito para ganhar dinheiro e divertir, se vai virar uma obra prima é outra situação, totalmente imprevisível que vai depender de múltiplos arranjos futuros, totalmente
    incontroláveis.
    2-"Nem por isso o filme de DeMille entra em alguma lista dos melhores".
    -Se uma obra artística não entra numa lista, feita sei lá por quem ou por qual motivo, ela deve ser considerada irremediavelmente perdida ou ruim? Ficar fora de uma lista, pode jogar no lixo?
    Guardando as devidas proporções, Os Dez Mandamentos foi um arrasa Coliseu, desculpe, quarteirão. Deixou DeMille, arrasado de tanto contar dinheiro.
    3-"A questão de um filme ser 'inesquecível' é bastante relativa pois uma película que pode ser inesquecível para alguns pode ser perfeita e facilmente esquecível para outros."
    -Como qualquer coisa neste mar de lágrimas.
    3”-Pergunto a você: será que Sergio Leone ....”
    -Por que pra ser bom teria que entrar numa lista de cinco? Numa lista de 20, 30, 50 melhores diretores, não estaria Leone bem confortável? Que pena que não podemos perguntar a ele. Ficar em último nesta lista, já seria um privilégio, não?
    4-“Creio que Leone está para o western-spaghetti assim como John Ford está ...”
    -Isso aí mesmo, no final você mesmo respondeu, milhares de filmes americanos, pioneiros, muito dinheiro, tecnologia, escolas de cinema, pesquisa, material humano, 70 anos de trabalho, quantidade, qualidade, etc.
    Na Europa; Uns 15 anos de vida, lisos, 560 filmes, material humano deficiente, gambiarras, pouca importância para técnicas, muita vontade, coragem , realismo, etc.
    PERGUNTAS PARA O FILME WESTERN TRADICIONAL: COMO AQUELES MALTRAPILHOS QUE GOSTAVAM DE SANGUE, DE COPIAR, QUE NUNCA VIRAM UMA PRADARIA, UM ÍNDIO, CONSEGUIRAM EM TÃO POUCO TEMPO RECRIAR UM GÊNERO QUE ESTAVA NA UTI, FIZESSEM OBRAS QUE AINDA ARREGIMENTAM FÃS, PROVOCAM DISCUSSÕES ACALORADAS E SOBREVIVE LEVANDO PORRADAS, MUITAS PORRADAS?
    Como algo considerado lixo provoca tanto preconceito?
    5-“ mas com o passar dos anos o que se verifica é que o Doutor Jivago permaneceu em nossas memórias, enquanto O Dólar Furado hoje é só um nome, para a maioria das pessoas. “
    -Como o sr. José Tadeu verificou esta falta de memória?

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  6. Joailton

    Em nenhum momento foi dito em meu comentário ou no comentário inicial que "O Dólar Furado" é uma obra-prima, o que, ao meu ver, seria um disparate descomunal.

    Duvido que DeMille não quisesse também ver seus filmes reconhecidos artisticamente. Veja o caso de Spielberg, outro que vem contando (muito) dinheiro há quatro décadas e persegue com tenacidade o reconhecimento da crítica como diretor, digamos, no patamar de Coppola, Scorsese e Woody Allen. A mais recente tentativa acabou derrotada na briga pelo Oscar.

    Pela reverência como Sergio Leone é tratado pelos estudiosos e pelos fãs do western-spaghetti seria lógico esperar que ele fosse reconhecido como um dos três, ou cinco, ou mesmo dez melhores diretores italianos de todos os tempos. Listas de 20, 30 ou 50 jamais terão a mesma importância de uma lista mais restrita. E mesmo para quem detesta listas, elas sempre existirão. Não havia me ocorrido ainda que ficar em último em qualquer modalidade de competição (ou listas) pode ser um privilégio.

    Ao dizer que Leone é considerado o John Ford dos spaghettis, deve-se situar as enormes diferenças, já citadas, entre os westerns norte-americanos e o subgênero criado na Europa. Vale lembrar que nenhum dos poucos verdadeiramente respeitados diretores de westerns-spaghettis começaram suas carreiras nesse tipo de filme. Muitos como o próprio Leone aprenderam muito com diretores norte-americanos de quem foram assistentes. A questão do preconceito que realmente existiu e ainda existe entre fãs dos originais norte-americanos deve-se, sem dúvida, à baixa qualidade da maior parte da produção de westerns-spaghettis. Nem todos têm paciência para garimpar os filmes que merecem maior atenção. Daí o preconceituoso'não vi e não gostei'.

    Curioso você, como fã de faroestes, centralizar suas argutas observações apenas nos westerns-spaghettis. Os westerns norte-americanos certamente merecem também sua atenção.

    Darci Fonseca

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  7. Se minha amiga e leitora de meu blog, Giuliana Gemma, filha de Giuliano Gemma souber deste debate aqui traçado sobre um dos mais respeitados filmes protagonizados por seu pai e que foi record de bilheteria em São Paulo e na Europa naquele ano, conforme página da cotação de cinema da revista Cinelândia editado em meu blog este mês a pedido de dezenas de fãs em sua grande maioria mulheres, ela seria capaz de mostrar pra ele o que estão dizendo e ele ficaria muito chocado com toda discussão a respeito.
    Mas o importante mesmo é que ninguém consegue entender por que o filme ainda está na midia à 48 anos fazendo sucesso como nesse espaço por exemplo.
    bangbangitaliana.blogspot.com

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  8. Darci, gostei demais dessa abordagem histórica, e que até cria uma certa atmosfera de ação, contrariando um pouco o que seria basicamente um relato.
    Bem, sobre essa história de nomes americanizados, era realmente desonesta, mas não se pode negar que estava apoiada na banal constatação de que as pessoas geralmente se guiam pelas aparências, e os espertalhões dos negocios não costumam ter dúvidas ao escolher entre ética e lucro... dominante e triste realidade humana! Curioso e cômico também o sucesso de um eurowestern na sala dita intelectual.

    Quanto a esse duelo, em meio à poeira, Western Americano x Western Europeu, costumo evitar, tentando apreciar aquilo que cada estilo oferece, e acabo vendo o western como um todo, constituído de partes, é claro, mas que se completam. Tenho muita admiração pelo western americano, mas, por outro lado, não ficaria nem um pouco feliz sequer de pensar na possibilidade de não se ter criado esse western que apostou na criatividade... sem limites, é verdade (???), mas que, mesmo com os defeitos que se possam apontar, acrescentou e tornou o gênero ainda maior.

    Abraço a todos!

    Vinícius Lemarc

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  9. Olá Vinicius
    Acredito que, inicialmente, os westerns rodados na Itália, quando ainda não batizados de spaghettis, fossem destinados ao mercado europeu - Itália, França e Espanha. Aí cabe uma pergunta: será que esses produtores europeus ávidos por lucro, como todos inclusive em Hollywood, acreditavam que conseguiriam iludir a todos? Ainda mais quando certos atores eram já conhecidos, caso de Volontè e de Giuliano Gemma. Realmente aquela turma não era séria!
    O duelo que você citou existe até hoje no Brasil e não só por culpa dos mais antigos acostumados a um estilo, digamos, mais acadêmico de se fazer western. Este blog me fez perceber que o radicalismo talvez seja ainda maior por parte dos apaixonados pelo western-spaghetti.
    O ideal, claro, seria que todos tivessem a sua visão isenta de preconceitos e pelo menos assistissem às duas vertentes. Mas não é o que acontece e fãs dos faroestes ditos originais são refratários aos spaghettis e a recíproca é tão ou mais verdadeira ainda.
    Sua última frase é perfeita e ao meu ver inegável pois no pouco tempo que durou a aventura européia pelos desertos de Almería influenciou o então sessentão western norte-americano.
    Abraço do Darci

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  10. Olá Darci
    Não sei se era só exclusivamente falta de seriedade para aquela turma trocar de nome, pois fatalmente qualquer um veria nos créditos iniciais de qualquer filme, onde foram produzidos e por quem. Acho que havia era muito complexo de inferioridade, mesmo, em relação ao americano, pareciam que estavam fazendo uma coisa proibida. Imagina um europeu fazendo western, que sacrilégio! Dificilmente alguém em bom juízo poderia achar que aquela empreitada daria certo e concordo que foram mesmo produzidos para a Europa.
    Veio este sucesso inesperado e logo perderam a vergonha e o complexo de inferioridade e não mais havia motivos para se esconderem atrás de pseudônimos.
    Este duelo de idéias, entre os fãs das duas vertentes é bastante salutar e não deve terminar tão cedo. Este blog é um exemplo. Os maiores embates entre leitores, foi quando este assunto western americano e spaghetti entraram no saloon. Afinal são mais de40 anos de chicotadas e as marcas não saem facilmente.
    Inclusive você tem dado puxão de orelha em leitores que só comentam quando o assunto é este, não sei quem são, mas...
    A turma dos italianos tem apenas reagido contra o preconceito, a intolerância e o radicalismo dos fãs dos americanos. Já disse que é pura bobagem ficar discutindo quem é o melhor ou pior. Deve-se discutir o filme, a obra, a sua capacidade de divertir, atrair e agradar.
    O próprio editor deste blog já confessou que fazia parte de um clube de western americano e que era proibido exibir nas suas sessões qualquer spaghetti e quem falasse no assunto tomava um banho de pixe com pena de galinha. Isto era o quê? Pelo menos sinto que ele não é mais aquele radical. Ótimas postagens sobre este assunto, estão saindo neste blog e eu agradeço. Mas ter umas recaídas faz parte da cura.
    O que realmente radicaliza a discussão é ficar ouvindo os mesmos velhos e gastos bordões, quando o assunto sapaghetti western entra em cena: Não tem tradição. Não são acadêmicos. Não são originais. Não tem contexto histórico. Provoca um rebaixamente qualitativo do gênero. Culturalmente inferior. Lixo sanguinolento. Não trata da mitologia norte-americana. Feito na Europa só pode ser inferior a qualquer outro made in USA. Violência gratuita. E outros tantos.
    A barreira ideológica levantada por cinéfilos e críticos contra os maltrapilhos, quase chega a se transformar num muro de Berlim, mas até este caiu.
    Tenho cerca de 1000 filmes e destes, os Italiano não chegam a 200. Preciso dizer que gosto de faroeste americano?

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  11. Olá, Joailton
    Antes e acima de tudo o blog se propõe a falar de westerns. Por isso chama-se Westerncinemania e goste-se ou não, o western spaghetti não deixa de ser também western.
    Continuo entendendo que a 'Turma da Bota' somente se manifesta quando alguém desanca com os spaghettis, o que me leva a crer que há sim, ou má vontade ou desconhecimento dos faroestes norte-americanos.
    Visto de um aspecto mais geral as frases que você utilizou como se fossem ditas por radicais anti-spaghettis não deixam de ter algum fundamento e fazem parte do repertório da maioria dos críticos quando o assunto é levantado. Repito que deve-se garimpar bastante para encontrar entre os mais de 500 westerns-spaghettis produzidos 10% que tenha a qualidade e a criatividade dos filmes de Leone e Corbucci. Você que possui 200 westerns-spaghettis deve conhecer exemplares que possam ser aceitos como filmes bons, muito bons ou ótimos.
    Passados quase 40 anos do fim do ciclo do westerns-spaghettis, a divisão persiste e raros são aqueles que aceitam sem restrições o faroeste produzido na Europa. Entre os aficionados há opiniões respeitáveis, entre elas a sua.
    Darci Fonseca

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  12. Vou aproveitar e fazer um esclarecimento aqui. Tudo que postei aqui nesse blog-que de fato é um espaço de alta qualidade- em forma de comentário, principalmente no Top Ten de Edelzio Sanches, nunca foi um meio de desancar o Western norte-americano, de demonstrar preconceito ou ojeriza a ele. Assim como no caso de Joailton possuo na minha videoteca bem mais americanos do que italianos. A verdade é que depois de ter lido muitas resenhas apressadas e até mau redigidas usando termos pejorativos como os citados pelo colega, para rebaixar o congênere europeu em revistas de cinema(com as devidas exceções) e também de ter ouvido pessoalmente pessoas (também com as devidas exceções) usarem expressões até ofensivas para classificar o gênero e muitas vezes sem embasamento, sem um devido conhecimento da história do cinema italiano/europeu resolvi de alguma forma desabafar contestando. Jamais classificarei um western norte-americanos de porcaria ou coisa desse gênero. Aliás nenhum filme merece esta pecha, ainda que existam os casos do que se chama de gosto duvidoso, mas isso é um caso à parte, não convém nos aprofundarmos aqui. Sou realmente grande fã dos spaghetti ,mas qualquer western merece ser assistido e, quer queira, quer não, o americano foi o grande modelo e fonte de inspiração, ainda que os europeus acrescentassem elementos próprios de sua história e cultura levando-o a outras direções. Tomo emprestadas aqui as oportunas palavras de Joailton que responde tudo:
    "A turma dos italianos tem apenas reagido contra o preconceito, a intolerância e o radicalismo dos fãs dos americanos. Já disse que é pura bobagem ficar discutindo quem é o melhor ou pior. Deve-se discutir o filme, a obra, a sua capacidade de divertir, atrair e agradar....". E completo com as sábias palavras de Vinícius Lemarc:
    "Tenho muita admiração pelo western americano, mas, por outro lado, não ficaria nem um pouco feliz sequer de pensar na possibilidade de não se ter criado esse western que apostou na criatividade... sem limites, é verdade (???), mas que, mesmo com os defeitos que se possam apontar, acrescentou e tornou o gênero ainda maior." O grande problema é que muita gente apegada ao tradicional são refratárias as renovações, não conseguem ver os avanços, não admitem a visão nova.
    Quanto ao percentual de spaghetti com qualidade, eu diria caro Darci, que chegaria a uns 20%, e esse número já foi suficiente para uma grande revolução estético-estilística.

    Também aqui vai meu abraço a todos!

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  13. Uma correção: ao criticar resenhas lidas por mim, na linha 6 do comentário "...depois de ter lido muitas resenhas apresadas e até mau redigidas..." acabei cometendo também um erro de redação. Não se escreve "mau redigidas" e sim "mal redigidas". Aplica-se o advérbio de modo mal e não o adjetivo mau, contrário de bom. Mal redigidas(resenhas) ou mal redigidos (textos) é o modo como determinada pessoa redige ou escreve. DESCULPEM A MINHA FALHA.

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  14. Caro Aprigio
    Este blog tem sido há mais de um ano um espaço onde o que mais se faz é discutir as diferenças entre o faroeste norte-americano e a vertente do gênero, o tão aclamado quanto difamado western-spaghetti. Há exaltados radicais de ambos os lados, assim como a voz sempre serena e coerente do admirável Vinicius LeMarc. Acredito que apesar dos naturais chamuscos houve sim saldo positivo com a discussão.
    Está certíssimo, na minha opinião, o Joailton quando afirma que "Deve-se discutir o filme, a obra...". Eu completaria dizendo que é tudo western e por isso mesmo fica difícil fugir de determinados parâmetros quando se faz uma análise dos filmes norte-americanos ou europeus. E esses parâmetros são os clássicos produzidos por Hollywood. Haveria Giuliano Gemma se Burt Lancaster não tivesse criado suas maravilhosas performances no cinema, especialmente em "Vera Cruz", filme que Gemma deve ter assistido pelo menos 20 vezes?
    Julgar um western-spaghetti a partir desses modelos é que leva à tão reclamada visão depreciativa em relação aos spaghettis. O cinema, assim como tudo na vida, é uma constante renovação, o que não significa que toda renovação seja positiva. No caso do western-spaghetti houve sim um ganho para o gênero, talvez muito menos importante do que os aficionados dos westerns europeus acreditam que tenha ocorrido.
    Confesso surpresa em saber que uma centena de westerns-spaghetti, como você lembra, possam ser considerados de boa qualidade. E por tudo que você já observou em seus comentários, você é sem dúvida um estudioso da 'reinvenção do faroeste', como alguns se referem aos westerns de Leone, Tessari e outros.
    Você disse que possui mais filmes norte-americanos que italianos em sua DVDteca, sem precisar se está se referindo a faroestes. Acredito que você possua então muitos dos faroestes já focalizados neste blog, sem no entanto, emitir opinião sobre eles. Isso sem dúvida é uma perda para todos aqueles que acompanham não apenas as postagens mas também as considerações dos leitores.
    Parafraseando o Joailton, "é tudo faroeste"...
    Um abraço do Darci Fonseca.

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  15. Acabei de ler o artigo do filme O DOLAR FURADO. Aqui no Rio, este filme fez muito sucesso. Foi exibido no circuito do Cinema Pathé e as filas eram imensas. Lembro que estava fazendo vestibular. A minha namorada se apaixonou pelo Gemma. Porém Doutor Jivago fez muito mais sucesso no espetacular cine Metro ( você passava na calçada e sentia o ar condicionado). Todos queriam ver a beleza de Julie Christie. O Tema de Lara era tocado por todas as radios (mais que o dolar furado) mas o tema de O Dolar era muito bom (acho que era Gino Ferrio) mas Doutor Jivago foi massacre aqui no Rio. Sensacional. Espero que alguem ainda leia este topico.
    CLÁUDIO SOARES DA COSTA

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  16. Oportunamente farei comentários sobre dois western já listados aqui em um Top Ten.

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  17. O dólar furado, pra mim, está entre os 5 maiores westerns, de todos tempos.

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