UMA REVISTA ELETRÔNICA QUE FOCALIZA O GÊNERO WESTERN

29 de abril de 2011

MOCINHOS ANIVERSARIANTES DE MAIO

Maio é o mês dos cowboys pois muitos dos grandes mocinhos (e bandidos)
da tela nasceram neste mês. 22 deles estão no quadro acima e são os
seguintes: John Wayne em destaque - Henry Fonda - James Arness -
Clint Eastwood - Pernell Roberts - Glenn Ford - Chuck Roberson -
John Payne - Clint Walker - Gary Cooper - George Gabby Hayes -
Lex Barker - Harry Woods - Tyrone Power - Bruce Boxleitner -
Jack Holt - James Stewart - Denver Pyle - Robert J. Wilke -
Jack Randall - Harry carey Jr. - Jay Silverheels

28 de abril de 2011

EDDIE DEAN E A DURA VIDA NA POVERTY ROW


Em Hollywood havia uma rua chamada Gower Street onde ficavam algumas pequenas companhias cinematográficas. Ao redor da Gower Street encontravam-se outras igualmente modestíssimas produtoras, o que levou aquela região a receber o apelido de Poverty Row, que pode ser traduzido livremente por “Zona da Pobreza”. Praticamente todos os estúdios da Poverty Row eram especializados em filmes de baixíssimo orçamento, a grande maioria deles B-westerns. A companhia mais poderosa entre essas pequenas produtoras era a Republic Pictures. Mas houve uma que ficou bastante conhecida dos frequentadores das matinês domingueiras, que foi a Producers Releasing Corporation, mais conhecida por PRC. Essa companhia tinha em seu elenco de contratados um mocinho chamado Eddie Dean que nunca foi o favorito de nenhum menino apaixonado por filmes de mocinho. A concorrência naquele tempo era enorme e Eddie Dean tinha que brigar com os famosos Roy Rogers, Durango Kid, Tim Holt, Rocky Lane, Bill Elliott e Hopalong Cassidy, ou seja, não era nada fácil se sobressair diante de mocinhos tão queridos. Mesmo assim Eddie Dean, usando seu próprio nome como mocinho nos filmes, conseguiu aparecer em 19 westerns produzidos pela PRC entre os anos de 1945 a 1948. Nos dois primeiros teve a companhia de um mocinho que se iniciava e tinha o nome de Al LaRue. Como usava um chicote acabou virando “Lash” La Rue e no Brasil foi o personagem de um dos gibis mais famosos que era Don Chicote. O sidekick de Eddie Dean em grande parte dos seus westerns foi o ator Roscoe Ates que interpretava o boboca Soapy Jones. E o diretor Ray Taylor dirigiu a maior parte dos filmes em que Eddie Dean atuou. Dean usou nessa série três cavalos Cooper, White Cloud e Flash, o que dava um nó na cabeça da garotada que além de conhecer os mocinhos adorava saber os nomes dos cavalos de cada um.

E TOME CENAS DE ARQUIVO - A PRC economizava tanto em seus filmes, usando cenas de arquivo, o chamado “stock footage”, que em alguns filmes Eddie Dean aparecia montando Cooper e, de repente, estava montando White Eagle ou Flash, para desespero dos pequenos espectadores que achavam isso uma heresia. Porém quando a PRC exagerou de verdade na economia foi no último western que Eddie Dean fez como mocinho naquele estúdio, em 1948, e que se chamou “The Tioga Kid”. Estudiosos dos B-westerns conseguiram cronometrar que nesse filme de 54 minutos, apenas 15 minutos eram de material novo, ou seja, filmado para aquele western. O restante havia sido utilizado no western de Eddie Dean chamado “The Drifter River”, que tinha no elenco William Fawcett e Dennis Moore, que também atuaram em “The Tioga Kid”. Mudaram a mocinha, substituindo Shirley Patterson por Jennifer Holt, mas usaram Flash, um cavalo que Eddie Dean não vinha usando nos seus últimos filmes. Economia era a palavra de ordem na PRC, mas nesse caso o que o estúdio fez foi lesar os pequenos consumidores que iam vibrar com os mocinhos nos cineminhas de bairro com cadeiras de madeira. Eddie Dean, além de bom intérprete era também compositor de talento e como cantor possuía uma das mais belas vozes entre os cowboys cantores. Imortalizou a si próprio não como o discreto mocinho da PRC, mas com sua composição “Hillbilly Heaven”, canção que falava dos grandes cantores da música country. (procure pelo vídeo nos arquivos do mês de fevereiro do Cinewesternmania)

27 de abril de 2011

WALTER WANGER, O PRODUTOR DE "NO TEMPO DAS DILIGÊNCIAS"

O elenco de "Stagecoach": Claire Trevor, John Wayne, Andy Devine,
John Carradine, Louise Platt, Thomas Mitchell, Berton Churchill,
Donald Meek e George Bancroft. Abaixo John Ford e Walter Wanger.

John Ford leu um conto na revista Collier’s que chamou sua atenção. O título do conto era “Stage to Lordsburg” e seu autor Ernest Haycox. “Essa é uma grande história e pode dar um bom filme”, pensou o genioso diretor. Comprou os direitos por 2.500 dólares e procurou os estúdios para fazer um filme a partir daquela história. Nenhum dos chefões gostou da idéia. Um deles até lhe respondeu: “Mas é um western! Ninguém mais faz westerns!" O renitente sangue irlandês de Ford falou mais alto e ele então foi atrás de um produtor independente. Conversou com Joseph Kennedy (o pai do presidente Kennedy, que entre outras coisas era também envolvido com cinema), falou com David O. Selznick e outros, mas nenhum deles quis apostar em um western, mesmo que fosse dirigido pelo respeitado John Ford. De fato os westerns estavam fora de moda e mesmo Ford não dirigira nenhum faroeste nos últimos 13 anos. O último havia sido “Três Homens Maus” (Three Bad Men), em 1926. Ford continuou procurando recursos até chegar em Walter Wanger, produtor independente que distribuía seus filmes pela United Artists. Walter disse que toparia a empreitada de produzir aquele western desde que Gary Cooper interpretasse Ringo Kid e Marlene Dietrich fosse a prostituta Dallas. Quando Ford disse a Walter Wanger que queria filmar com o maior realismo possível com locações em um lugar chamado Monument Valley e com a diligência perseguida por índios, Wanger, que não descuidava das cifras, desistiu dos prestigiados e caros Gary Cooper e Marlene Dietrich. Os papéis de Ringo e Dallas acabaram nas mãos de um ator de B-Westerns pouco conhecido chamado John Wayne e de Claire Trevor, que havia sido vista em 1937 em “Beco Sem Saída”, de William Wyler. “No tempo das Diligências” custou 400 mil dólares e até que foi bem nas bilheterias, rendendo mais de um milhão de dólares no seu primeiro ano de exibição. Porém mais do que o lucro que possa ter dado, esse filme mudou a história do cinema pois depois dele o gênero western passou a ser respeitado e praticamente todo diretor ou artista de Hollywood fez faroestes.

UMA TRAGÉDIA NA VIDA DE WALTER WANGER - Mas quem é mesmo o homem que possibilitou que “No Tempo das Diligências” fosse filmado? Nascido em San Francisco, Califórnia em 1894, Walter Wanger começou a trabalhar em 1920 na Paramount, passando por quase todos os demais estúdios de Hollywood, até tornar-se um bem sucedido produtor independente. Entre seus filmes mais lembrados estão “Hotel da Fuzarca” (com os Irmãos Marx), “Rainha Cristina” (com Greta garbo), “Correspondente Estrangeiro” (de Alfred Hitchcock), “Joana d”Arc” (com Ingrid Bergman), “Vampiro de Almas” (de Don Siegel), “Quero Viver” (com Susan Hayward) e os westerns “Abrindo Horizontes” (com Sterling Hayden), “O Forte da Coragem” (de Lesley Selander), “A Irresistível Salomé” (com Yvonne De Carlo e Rod Cameron) e “Amor e Ódio na Floresta” (com Henry Fonda). Como produtor Walter Wanger tinha sob contrato a atriz Joan Bennett, sua verdadeira musa. Casaram-se em 1940 e Walter mudou a imagem de Joan fazendo-a tingir os cabelos de preto e passando a produzir filmes estrelados por ela, entre eles “O Homem que Quis Matar Hitler”, “Um Retrato de Mulher”, “O Segredo da Porta Fechada”, Almas Perversas” (dirigidos por Fritz Lang, os três últimos clássicos do film noir). Em 1951 Walter Wanger começou a suspeitar que sua mulher estava tendo um caso com o agente Jennings Lang. Armou um flagrante e surpreendeu Joan num apartamento com seu amante, que tinha 1,91 de altura. Walter estava armado e disparou contra Jennings, mirando e acertando nos testículos do agente. Mesmo ferido Jennings conseguiu sobreviver, mas certamente nunca mais fez uso indevido de seu charme de conquistador. Mesmo em defesa da honra, Walter Wanger foi preso e condenado, cumprindo pena de três anos na prisão de San Quentin. Observando a vida na prisão, o primeiro filme que Wanger produziu após ser libertado foi “Rebelião no Presídio”, estrelado por Neville Brand e dirigido por Don Siegel. Joan e Walter, que tinham dois filhos, divorciaram-se em 1965. O escândalo que resultou na prisão de Walter Wanger, praticamente arruinou a carreira de Joan Bennett. Walter ainda produziria outros filmes, o último deles o malfadado “Cleópatra", com Elizabeth Taylor. Walter faleceu em 1968 de ataque cárdiaco, mas antes ainda teve tempo de escrever o livro “Minha Vida com Cleópatra”, em que procura contar porque o filme custou tão caro, quase levando a 20th Century-Fox à falência. Walter Wanger produziu mais de 70 filmes, porém seu nome está gravado no álbum de ouro do cinema por ter sido o homem que possibilitou a John Ford ter realizado uma das obras-primas da cinematografia universal que foi “No Tempo das Diligências”.

26 de abril de 2011

TOP-TEN WESTERNS DE ARGEMIRO ANTUNES


Eu o chamo de “Miro Leone”, tal a sua admiração pelo extraordinário diretor italiano que foi o revitalizador e criador da nova estética do Western. Seu nome verdadeiro é Argemiro Antunes e ele mora em Santos, onde também residia Umberto ‘Hoppy’ Losso, um dos patronos deste blog. Assim como era Hoppy Losso, Miro é também talentoso desenhista e ilustrador. Os dois santistas se encontravam quase que diariamente, desde os tempos da Cinemateca de Santos (dirigida pelo também saudoso Maurice Legeard) e o assunto que Miro e Losso mais falavam era, claro, cinema, mais especificamente faroestes. Miro é profundo conhecedor da 7.ª Arte em geral e a amizade com Losso fez dele também um apreciador dos melhores westerns. E Miro listou seus Top-Ten, que são os seguintes:

1.º) “Era Uma Vez no Oeste” (C’Era Uma Volta Il West), 1968 – Sergio Leone

2.º) “O Homem que Matou o Facínora” (The Man Who Shot Liberty Valance), 1962 – John Ford

3.º) “Da Terra Nascem os Homens” (The Big Country), 1958 – William Wyler

4.º “Paixão dos Fortes” (My Darling Clementine), 1946 – John Ford

5.º) “No Tempo das Diligências” (Stagecoach), 1939 – John Ford

6.º) “Meu Ódio Será Sua Herança” (The Wild Bunch), 1969 – Sam Peckinpah

7.º) “Johnny Guitar”, 1954 – Nicholas Ray

8.º) “Pistoleiros do Entardecer” (Ride the High Country), 1962 – Sam Peckinpah

9.º) “Rastros de Ódio” (The Searchers), 1956 – John Ford

10.º) “Sua Última Façanha” (Lonely Are the Braves), 1962 – David Miller


TOP-TEN WESTERNS DO SHERIFF DE RANCHER TOWN


Existe todo tipo de westernmaníaco. Tem aquele que devora westerns pela TV ou no cinema. Há aqueles que gostam tanto de westerns que se tornam grandes colecionadores de filmes do gênero, tendo em sua DVDteca desde os clássicos de John Wayne e Clint Eastwood até aquele faroeste que só ele e mais ninguém conhece. Existem ainda os que tem suas roupas de cowboy, botas, chapéu, cinturão e belas réplicas de Colts e Winchesters. Mas westernmaníacos como André Antônio Bova só são encontrados na Califórnia, no Arizona ou no Texas. O brasileiro André tem tanta admiração pelo western que ele mesmo construiu sua própria cidadezinha do Velho Oeste, cujo nome é "Rancher Town". Lá ele é o Sheriff, impondo a Lei e a Ordem e tomando conta do estábulo, do saloon, da cadeia, do curral, dos cavalos e da sua coleção de armas de brinquedo que eram o sonho dos garotos dos anos 50, 60 e 70. E o que André não tem ele próprio fábrica pois é um verdadeiro e hábil artesão capaz de esculpír em madeira réplicas de Colts Army, Navy, Dragon e Peacemaker. Essa paixão do André nasceu assistindo faroestes e entre as centenas que ele já viu André enumerou os dez que ele considera os melhores. E especialmente para o WESTERNCINEMANIA ele fez um pequeno comentário a respeito de “Pacto de Justiça”: “Esta obra em especial acredito ter sido a que mais se aproxima do que foi verdade, sem muito romantismo, sem ficção. Uma história de coragem e uma visão de como se manejava as armas.”
Eis os Top-Ten do Sheriff de Rancher Town:

1.º) “Pacto de Justiça” (Open Range), 2003 – Kevin Costner

2.º) “Butch Cassidy & Sundance Kid”, 1969 – George Roy Hill

3.º) “Os Imperdoáveis” (Unforgiven), 1992 – Clint Eastwood

4.º “Vou, Mato e Volto” (Vado, L’Amazzo e Torno), 1967 – Enzo G. Castellari

5.º) "Sete Homens e um Destino” (The Magnificent Seven), 1960 – John Sturges

6.º) “Era Uma Vez no Oeste” (C’Era Uma Volta Il West), 1968 – Sergio Leone

7.º) “Os Cowboys” (The Cowboys), 1972 – Mark Rydell

8.º) “Tombstone, A Justiça Está Chegando” (Tombstone), 1993 – George Pan Cosmatos

9.º) “Wyatt Earp”, 1994 – Lawrence Kasdan

10.º) “Dança com Lobos” (Dances with Wolves), 1990 – Kevin Costner


O JESSE JAMES DO POLÊMICO NICHOLAS RAY



Nicholas Ray tornou-se um diretor célebre quando tratou da rebeldia dos adolescentes, num tempo em que isso era tabu no cinema. Seu “Juventude Transviada” (Rebel Without a Cause), 1955, deu o que falar e praticamente abriu as portas do cinema para analisar o comportamento dos jovens. Logo a seguir Ray tentou fazer o mesmo em um western chamado “Quem foi Jesse James” (The True Story of Jesse James), filmado em 1956 e lançado em 1957. Ray pretendia que James Dean interpretasse Jesse James, uma vez que o diretor queria dar um tom de rebeldia à vida do lendário fora-da-lei. James Dean faleceu antes e Robert Wagner, sem o carisma de Dean acabou protagonizando Jesse James, enquanto seu irmão Frank foi vivido por Jeffrey Hunter. Na versão de “Jesse James” de 1939, estrelada por Tyrone Power (Jesse) e Henry Fonda (Frank), os irmãos James tornaram-se malfeitores devido aos acontecimentos sócio-econômicos que ocorriam nos estados do Sul derrotados pelas forças nortistas americanas na Guerra Civil. Em “Quem Matou Jesse James”, Ray tentou mostrar que os irmãos foram atraídos para a criminalidade por não conseguirem se enquadrar num mundo em que os jovens não tinham vez, restando a eles apenas obedecer. Portanto Ray descobriu uma causa para os irmãos sulistas jovens e rebeldes. A 20th Century-Fox, que produzira a versão de 1939, dirigida por Henry King, também produziu o western de Ray que antes de “Juventude Transviada” já havia chamado bastante a atenção da crítica, especialmente com o intrigante western “Johnny Guitar”. Mas a Fox não ficou satisfeita com o trabalho de Nicholas Ray em “Quem Matou Jesse James” e drasticamente editou o filme, tirando do mesmo a interpretação psicológica que Nicholas Ray havia dado ao filme. A Fox reduziu esse western de 105 para 92 minutos, o que fez com que Ray nunca aceitasse “Quem Matou Jesse James” como um filme seu e o relegasse a um plano inferior na sua cinematografia.

O temperamental casal Gloria e Nicholas
RAY E OS ADOLESCENTES - Poucos diretores tentaram compreender os jovens como Nicholas Ray. Desde seu primeiro filme que foi “Amarga Esperança” (They Live by Night), com Farley Granger e Cathy O’Donnell, não exatamente adolescentes, mas já se defrontando com a inadequação em um mundo adulto. E veio “Juventude Transviada”, em que Nicholas Ray tentou tão inteiramente compreender os jovens que até manteve um tórrido relacionamento amoroso com Natalie Wood, não respeitando nem a gritante diferença de 27 anos entre suas idades. Ele tinha 43 e ela 16. Dennis Hopper queria matá-lo pois a volúvel Natalie era, então, sua namorada. Interessante que, nesse affair, Ray não procurou compreender o jovem e já incompreendido eviolento Dennis Hopper. Mas Nicholas Ray se entendeu bastante bem com James Dean e com Sal Mineo, dos quais se tornou grande amigo e mentor. Poucos diretores teriam a coragem que teve Ray, ao colocar na tela um gay ainda adolescente interpretado por Sal Mineo. Tanto e tão profundamente Ray entendia os adolescentes que, quando encontrou seu filho do primeiro casamento (Anthony Ray), então com 13 anos, na cama com sua esposa, a atriz Gloria Grahame, Nicholas Ray não tomou nenhuma atitude passional, como teria tomado aquele personagem de Lee Marvin que jogou café fervendo no rosto de Glória em “Os Corruptos” (The Big Heat). Ray separou-se da inquieta atriz, é verdade, mas ninguém saiu mortalmente ferido do escândalo. Difícil mesmo deve ter sido para Ray ser trocado pelo filho já que Anthony Ray casou-se com Gloria Grahame em 1960 e com ela viveu por 14 anos, enquanto Gloria e Ray ficaram casados apenas quatro anos. Gloria era uma madura mulher de 37 anos e o filho de Nicholas Ray mal tinha completado 20 anos quando se casaram. A única atitude de Nicholas foi pedir a guarda do filho Timothy que ele tivera com Gloria pois sabe-se lá o que poderia passar pela cabeça da ex-mulher.

Ray dando uma
tragada...
PROFESSOR MUITO LOUCO - A trajetória de Nicholas Ray como diretor teve um final prematuro pois o cigarro e as drogas minaram sua saúde. Depois de “O Rei dos Reis” (deixar Nick Ray filmar a vida de Cristo foi uma temeridade...) e “55 Dias em Pequim” a carreira (cinematográfica) de Ray estava acabada. Nesta última superprodução Ray teve um ataque cardíaco que o afastou do filme. O antigo desafeto Dennis Hopper foi quem ajudou Nicholas Ray conseguindo que ele passasse a ministrar aulas na Universidade de Nova York. O homem que deu espaço para os jovens e seus problemas nas telas, era agora professor de cinema de alunos como Jim Jarmusch (diretor do controvertido western “Dead Man”, com Robert Mitchum). Como professor, Nicholas Ray pedia aos seus alunos que fumassem maconha durante as aulas para melhor interpretar suas teorias. E depois tem gente que ainda diz que a juventude que é transviada...

25 de abril de 2011

EM "GATILHO RELÂMPAGO" O DUELO É NA QUINTA-FEIRA

Todos conhecemos aquele tipo de chato que durante um filme fala o tempo todo, aquele que só presta a atenção a detalhes irrelevantes que, afinal, não levam a nada. Mas há alguém que se superou quando assistiu ao filme “Gatilho Relâmpago” (The Fastest Gun Alive), com Glenn Ford. O momento culminante desse western é quando, num domingo, Glenn Ford (George Kelby Jr.) está na missa e é desafiado pelo pistoleiro Broderick Crawford (Vinnie Harold). Glenn sai da igreja e enfrenta o rotundo bandidão. Na cena final vê-se dois túmulos, ambos indicando a data das mortes dos gunfighters como sendo 7 de novembro de 1889. Pois o chato-mór foi conferir num calendário de 1889 e apurou que o dia 7 de novembro de 1889 caia numa... quinta-feira e não num domingo. Esse camarada deveria se chamar Chatonildo Pentelho Mala, mas podem chamá-lo carinhosamente de Cri-Cri.

"AH, LOS GRINGOS OTRA VEZ!" - A INSPIRADA CAMINHADA DE SAM PECKINPAH


Certos atores e diretores só trabalhavam seguindo rigorosamente o roteiro. Se Clark Gable estivesse fazendo uma cena, aí do ator que com ele contracenasse e mudasse uma fala qualquer. E o mesmo valia para quase todos os diretores que detestavam improvisos. Por isso Marlon Brando era tão temido pelos diretores e por isso também Sam Peckinpah sempre gastava mais do que o orçamento permitia pois era um diretor instintivo e que sentia quando uma sequência poderia crescer, mesmo fugindo das ‘amarras’ do roteiro original. Isso aconteceu em uma das melhores cenas da sua obra-prima “Meu Ódio Será sua Herança” (The Wild Bunch).

O roteiro de Wallon Green foi bastante alterado por Peckinpah antes de ser dado como pronto. Naquela dia Sam acordou como de hábito às quatro da manhã e nem bem o sol raiou lá estava ele sentado, com o roteiro nas mãos olhando o set de filmagem na localidade de Parras, no México. Pouco a pouco atores, técnicos e extras foram chegando para mais um dia de trabalho. A cena a ser inicialmente filmada eram três mera linhas no roteiro e dizia: “Pike, Lyle e Tector saem do bordel. Dutch que estava sentado à porta levanta-se. Os quatro homens vão até seus cavalos e retiram seus rifles. Os quatro homens chegam ao local onde está o General Mapache reunido com o alto comando. Mapache vê os quatro homens e diz: Ah! Los gringos otra vez!” Tudo pronto para essa cena que não levaria mais que dois minutos para ser filmada. Cliff Coleman, o assistente de direção já levava o grupo para onde seria filmada a cena dos quatro diante de Mapache. De repente, Sam chama Coleman e o cinegrafista Lucien Ballard e diz a eles que queria fazer uma tomada com Bill Holden, Warren, Ben e Ernie fazendo uma lenta caminhada da porta do bordel até onde se encontrava Mapache. Ninguém entendeu bem o que Sam queria e ele mostrou como seria a cena, caminhando ele mesmo acompanhado pelos técnicos. Cliff ainda lembrou que aquilo não estava no roteiro e nem haviam sido feitos storyboards (desenhos de produção indicativos de como seria a sequência) mas Sam não lhe deu atenção. Cliff Coleman chamou os stand-in (dublês) de Bill Holden, Warren, Ben e Ernie e os fez percorrer a caminhada de 50 ou 60 metros. Sam gostou mas pediu que figurantes se movimentassem normalmente próximos à passagem do quarteto. Sam pediu que houvesse música mexicana ambientando a cena. Coleman então alinhou os quatro atores principais que fizeram sem contestar o ensaio do jeito que Sam queria. E a seguir iniciaram as tomadas para valer, com câmeras em vários ângulos, da caminhada de Pike, Dutch, Lyle e Tector.

General Mapache
As duas centenas de pessoas que assistiam às filmagens, a maioria delas figurantes, se arrepiaram. Todos perceberam que o que Peckinpah estava fazendo era pura mágia. Emocionado, Coleman falou consigo mesmo: “Jesus Cristo. Que coisa extraordinária!” A materialização da espontânea criatividade de Peckinpah fez com que apenas com a marcha dos quatro atores, sem nenhuma palavra trocada entre eles, fossem transmitidos todos os sentimentos que daqueles homens se apossara naquela decisão de caminhar para a morte. Num átimo, quatro mentes definiram a razão de suas existências. Entre tantos momentos memoráveis de “Meu Ódio Será sua Herança”, um dos mais emocionantes é justamente aquele em que ninguém fala, nenhum tiro é disparado, até que um embriagado El Índio Emílio Fernández (Mapache) diz a fala célebre: “Ah, los gringos otra vez!”, dando início ao clímax do filme com o cenário sendo transformado na batalha mais poética de todos os tempos.

JOHN WAYNE E SEUS FILHOS NO CINEMA


John Wayne era um homem muito poderoso em Hollywood. E com todo aquele poder podia até se dar ao direito de fazer uso de nepotismo no cinema, que a bem da verdade, não foi ele quem inventou. Mas se não inventou, o Duke aperfeiçoou o nepotismo no faroeste. Tudo começou em “Rio Grande”, quando o diretor John Ford permitiu que um garoto de 10 anos chamado Patrick, filho do astro e amigo John Wayne aparecesse naquele que foi o terceiro western da trilogia do Pappy sobre a Cavalaria. Como Ford e Wayne eram praticamente compadres, o adolescente Patrick fez pontas em “Depois do Vendaval”, “O Sol Brilha na Imensidão” e “Mister Roberts” (Ford dirigiu parte do filme), dirigidos por Ford e também em “Sangue de Bárbaros” (The Conqueror). Em “Depois do Vendaval”, todos os filhos de John Wayne estão na cena da corrida de cavalos: Michael Morrison, Tony (Maria Antonia Morrison), Patrick Wayne e Melissa Ann Morrison. Em 1955, aos 16 anos, Patrick Wayne fez uma participação totalmente dispensável em, “Rastros de Ódio”, interpretando o Lt. Greenhill, sob o olhar orgulhoso do pai que interpretava o errante Ethan Edwards nesse grande western. A partir daí Patrick se soltou um pouco na carreira de ator, mas em 1959 estava filmando novamente sob a direção do papai Wayne em “O Álamo”, por ele dirigido. Nesse épico sobre os 13 dias de glória do bravo grupo de homens que defendeu o Texas, John Wayne estendeu o nepotismo a suas filhas Aissa, então com quatro aninhos, e Tony, então com 23 anos. “O Álamo” foi um filme realizado pela Batjac, produtora de John Wayne, o que quer dizer que era ele quem mandava em tudo e para ajudá-lo trouxe seu filho mais velho, Michael Anthony Morrison que atuou como produtor e primeiro assistente de direção. Ninguém poderia contrariar o dono de “O Álamo” que por pouco não colocava toda a família em seu filme.

O nepotismo de John Wayne procurava impulsionar a carreira do filho Patrick que apareceu sucessivamente em “Os Comancheiros”, “Quando um Homem é Homem”, “O Aventureiro do Pacífico” e “Crepúsculo de uma Raça”, ou seja filmes em que o paizão atuava, os dois últimos dirigidos pelo ‘titio’ John Ford. Para selar sua amizade com John Wayne, Andrew V. McLaglen deu a Patrick Wayne um bom papel em “Shenandoah”. John Wayne produziu e dirigiu “Os Boinas Verdes” e aproveitou para vestir Patrick como soldado do exército norte-americano e o colocou nessa espécie de tropa de elite das forças de Tio Sam na na sua versão da guerra do Vietnã. Quando não atuava em filmes com John Wayne, Patrick só conseguia trabalho em séries da televisão, até que em 1970 John Wayne produziu “Jake, o Grandão”. Wayne não teve dúvidas e promoveu a gloriosa estréia de seu filho caçula, John Ethan Wayne no cinema, aos oito anos, já que Ethan nascera em 1962 e recebera na pia batismal o nome da maior personagem vivida por John Wayne nas telas: Ethan. Produzido pela Batjac, o produtor de “Jake o Grandão” só poderia ser Michael, o filho mais velho do Duke. E Patrick teve também uma participação destacada nesse western que acabou sendo outra clara evidência que John Wayne acreditava no dito popular que “Família que trabalha unida permanece unida”. Como produtor Michael não teve carreira muito notável, assim como Patrick e Ethan que insistiram na profissão de ator, mas em nada lembrando a extraordinária vida artística de John Wayne. A filha caçula do Duke, Marisa, nascida em 1966 foi a única, entre seus sete filhos, a não ser encaminhada para o cinema. E John Wayne sabia o que estava fazendo com seu indisfarçado nepotismo pois, como ator, acumulou razoável fortuna e legou aos filhos um espólio que seguramente lhes permitiu viver longe da pobreza até os dias de hoje.

Os filhos de John Wayne em épocas diferentes: acima com o pai e Gene Autry
estão Tony, Melissa, Patrick e Michael. abaixo por ocasião do lançamento do
selo com a estampa de John Wayne aparecem Patrick, Marisa, Ethan, Aissa
e Melinda. (O senhor grisalho é da comissão que elaborou a homenagem)

24 de abril de 2011

GEORGE SHERMAN E DUKE, O GRANDÃO DE BOM CORAÇÃO


Doc Barretti, o fundador do clube paulistano que congrega os amigos do western, certa vez indicou “Jake, o Grandão” como um dos faroestes de John Wayne que ele mais admirava. Doc Barretti começou a ver filmes nos anos 30 e tornou-se fã do Duke vendo a série de B-Westerns “Os Três Mosqueteiros”, na qual John Wayne herdou o papel do Mesquiteer Stony Brooke, antes interpretado por Robert Livingstone. O diretor da grande maioria de filmes dessa série chamava-se George Sherman, novaiorquino nascido em 1908. Quando John Wayne passou para os filmes A, depois de seu encontro com John Ford em “No Tempo das Diligências”, Sherman continuou fazendo B-Westerns, alguns deles lembrados entre os melhores de todos os tempos, como “Mexicali Rose” (com Gene Autry e Noah Beery), 1939 e “The Tulsa Kid” (com Don Red Barry e Noah Beery), 1940. No final dos anos 40 George Sherman passou a dirigir filmes de melhor orçamento e assim como havia sido um prolífico diretor de B-Westerns, na Republic Pictures, Sherman prosseguiu incansavelmente na direção de policiais, capa-e-espadas e, claro, westerns, a sua especialidade. Nos anos 50 Sherman dirigiu muitos westerns e entre os mais conhecidos estão “A Revolta dos Pele Vermelhas” (Battle at the Apache Pass), com Jeff Chandler; “Coração Selvagem” (Tomahawk), e “Na Sombra do Disfarce” (The Lone Hand), ambos com Joel McCrea; “O Tesouro de Pancho Villa” (The Treasure of Pancho Villa), com Rory Calhoun; “O Grande Guerreiro” (Chief Crazy Horse), com Victor Mature; e um dos melhores westerns de Audie Murphy, intitulado “Com o Dedo no Gatilho” (Hell Bent for Leather). Sherman dirigiu outros gêneros de filmes e um de seus trabalhos mais conhecidos e bem produzidos foi “Contra Todas as Bandeiras” (Against All Flags), estrelado por Errol Flynn.

Nos anos 60 Sherman diminuiu consideravelmente seu ritmo de trabalho no cinema, mal dirigindo um filme por ano, ele que nos áureos tempos da Republic Pictures dirigia a média de dez westerns por ano e na década de 50 teve média de três a quatro filmes dirigidos anualmente. Com mais de 50 anos de idade Sherman passou a dirigir séries de TV como “Cidade Nua”, “Rota 66” e “Daniel Boone”. Conseguiu voltar ao cinema dirigindo dois longa-metragens estrelado por Fess Parker como o pioneiro Daniel Boone. Dirigiu ainda a biografia do Robin Hood mexicano, protagonizado por Jeffrey Hunter, em “Joaquin Murieta”. George Sherman emprestou então sua experiência para o cinema espanhol dirigindo a estrelinha Marisol em “A Nova Cinderela” (La Nueva Cenicienta) e em “Busqueme a esa Chica”. Antes que alguém estranhe, vale lembrar que até nosso querido Anselmo Duarte atuou em "Um Raio de Luz", filme da menina loura espanhola que desfrutava de prestígio igual ao do Pequeno Rouxinol Joselito. Parecia o fim da carreira do competente George Sherman. Mas não era porque John Wayne reservara para ele uma agradável surpresa quando, em 1970, o convidou para dirigir “Jake, o Grandão" (Big Jake), produção da Batjac de John Wayne. Aos 61 anos, dois a menos que o Duke, Sherman, os atores e a equipe técnica foram para Durango (México), locação para “Jake, o Grandão”. George Sherman dirigiu parte do filme, até adoecer e quem assumiu a direção e concluiu o western foi John Wayne, que em respeito ao amigo preferiu não ter crédito como co-diretor. Esse foi o último filme dirigido pelo veterano George Sherman, de quem Big John Wayne nunca esqueceu, prestando-lhe uma bela homenagem com a direção de “Big Jake”. John Wayne, o Grandão de bom coração.

23 de abril de 2011

DELICIOSOS SPAGHETTINI-WESTERNS



Os produtores de Holywood gostavam de reunir dois grandes astros em um western. Era quase certeza de lucro enorme ter no mesmo faroeste Gary Cooper-Burt Lancaster / Burt Lancaster-Kirk Douglas / Kirk Douglas-John Wayne / John Wayne-James Stewart / James Stewart-Richard Widmark / Richard Widmark-Robert Mitchum e mais um incontável número de astros que sozinhos arrastavam grande público para as bilheterias e, em dupla deveriam dobrar a arrecadação dos westerns. Nem sempre isso era verdade, mas era uma prática interessante porque levava a uma ‘luta’ particular entre os artistas, um querendo superar o outro.

Os europeus, que também gostavam de fazer seus faroestes macarrônicos, tentaram essa fórmula reunindo dois grandes nomes de bilheteria, só que ao invés de dois astros reuniram duas grandes estrelas em westerns-spaghettini com a delicada Brigitte Bardot em dupla com Jeanne Moreau e em outro spaghettini, com Cláudia Cardinalle. Os westerns são “Viva Maria!”, de Louis Malle, 1965, e “As Petroleiras”, de Christian Jacque”, 1971. Mesmo aqueles que abominam os westerns-spaghetti certamente não deixaram de assistir a esses filmes para poder passar duas horas olhando para a graça, a malícia e a sensualidade dessas belíssimas mulheres. “Viva Maria!” passa-se em 1907, na América Central, com La Moreau e BB envolvendo-se com um revolucionário socialista e engajando-se ambas na luta contra o ditador, contra o capitalismo e contra a igreja (o roteiro é do buñueliano Jean Claude Carrière). No elenco o galã norte-americano George Hamilton no melhor papel de sua vida, pelo menos no que se refere às duas partners. Pensando bem, “Viva Maria!” não é assim tão spaghetti, mesmo porque o diretor é Louis Malle, além do que foi rodado apropriadamente no México. E Jeanne Moreau gostou tanto da experiência que, em 1970 juntou-se a Lee Marvin e a Jack Palance em “Um Homem Difícil de Matar” (Monte Walsh).

“As Petroleiras”, este sim é um legítimo spaghettini, ainda que o diretor seja francês, pois foi rodado, sabem onde? Acertou quem respondeu Almería, na Espanha. E como todo western-macarrônico não poderia faltar um ator norte-americano meio em baixa, desta vez Michael J. Pollard, o maluco C.W. Moss, de “Bonnie & Clyde”. Em “As Petroleiras” a companheira de BB é a maravilhosa Cláudia Cardinalle, acostumada com a aridez do deserto pois filmara até no Monument Valley, sob a direção de Sérgio Leone, no soberbo “Era Uma Vez no Oeste”. Difícil é dizer se Cláudia esteve mais sedutora na obra-prima de Leone ou fugindo de Lee Marvin, Burt Lancaster, Robert Ryan e Woody Strode, pelo amor de Jack Palance em “Os Profissionais”. E imaginem Cláudia Cardinalle brigando com BB para ver qual delas seduz mais a platéia masculina. E “As Petroleiras” tem no elenco uma outra charmosa atriz, Michelline Presle, francesa que mostrou seu talento e belo rosto em diversos filmes norte-americanos. Brigitte fez ainda outro western com o 007 Sean Connery, "Shalako", filme que vale por ela e nada mais.

Lembramos desses faroestes para mostrar aos radicais que torcem o nariz para os westerns-spaghetti, que alguns deles valem (e muito) à pena serem assistidos. No caso de La Moreau, BB e La Cardinalle, menos pelos filmes em si e mais por essas divas que bem poderiam ter feito muitos westerns mais para alegria dos westernmaníacos cansados de olhar para a carranca de John Wayne. Recentemente vimos “Bandidas”, com o mesmo esquema de duas mulheres lindas encabeçando o elenco de um faroeste. E repetiu-se a história, pois com Penélope Cruz e Salma Hayek na tela, quem quer prestar a atenção no enredo do filme, seja ele western ou não?

A IMPERDOÁVEL INJUSTIÇA DE CLINT EASTWOOD


Ninguém desconhece que a maioria das atrizes do cinema tinha que se submeter ao famoso teste do sofá, o que nem sempre era garantia de estrelato. Com os atores não era muito diferente e muitos deles tiveram também que agradar homens influentes nos estúdios para galgar os íngremes degraus da fama. Alguns desses poderosos chegavam mesmo a adotar atores como seus protegidos facilitando-lhes o acesso aos filmes. O exemplo mais conhecido é o de Rock Hudson, protegido por Douglas Sirk e que muito o ajudou na sua carreira. Sirk era um diretor alemão e foi quem deu a Rock o primeiro papel como astro principal em uma película. E dirigiu Rock Hudson no western “Herança Sagrada” (Taza, son of Cochise), fazendo dele um astro verdadeiro com o filme “Sublime Obsessão”, preparando Rock para “Assim Caminha a Humanidade”. A parceria de Rock e Sirk perdurou por toda a década de 50, na qual fizeram oito filmes juntos.

Clint Eastwood dedicou o western “Os Imperdoáveis” aos seus amigos diretores Sérgio Leone e Don Siegel que foram muito importantes em sua carreira, inclusive moldando o tipo de herói que lhe rendeu tanta fama e dinheiro (The Stranger + Harry Callaghan). É importante jamais esquecer quem nos presta alguma forma de ajuda e por isso Clint acertou na homenagem. Só que ela foi incompleta, ou no mínimo injusta com outro diretor, igualmente importante na sua carreira, quando ninguém sabia quem era Clint Eastwood. Seu nome é Arthur Lubin. Quando o iniciante Clint Eastwood já estava cansado de bater de porta em porta nos grandes e pequenos estúdios à procura de trabalho, Arthur Lubin foi quem, incansavelmente lutou por Clint. Lubin, dirigia filmes desde 1932 e nos anos 40 foi um dos mais profícuos diretores da Universal, dirigindo qualquer filme para o qual fosse escalado. Em 1950 acertou em cheio com a comédia “Francis”, em que um mulo falante (a voz era de Chill Wills) era a grande atração. O filme fez bastante sucesso e a Universal filmou várias sequências, todas dirigidas por Arthur Lubin. Clint Eastwood havia feito um teste na Universal e quem dirigiu o teste foi o próprio Lubin que gostou daquele moço alto e simpático pretendente a ator, aprovando-o com louvor no teste. Lubin encaminhou Clint para assinar contrato com o estúdio, logo colocando-o no elenco de “Francis na Marinha”, filme que ele estava para começar a dirigir. Depois de lhe conseguir o contrato com a Universal, Lubin passou a escalar Clint em todos os filmes que dirigia, num total de quatro e ainda, forçando que Clint aparecesse em outras produções do estúdio. Lubin fazia de tudo para que seu protegido alcançasse a fama, de preferência pelas suas mãos pois pretendia que Clint Eastwood fosse para ele o que Rock Hudson representou para Douglas Sirk. Ocorre que Douglas Sirk possuía um evidente talento, tornando-se uma espécie de Rei do Melodrama em Hollywood.

Percebendo que a ajuda de Lubin não o estava levando a parte alguma, Clint conseguiu o papel de Rowdy Yates na série “Rawhide”, em 1959. Semana após semana Clint foi se tornando um nome e um rosto conhecido do público. Lubin, por sua vez, passou a dirigir séries para a TV produzidas pela Universal, entre elas “Mr. Ed”, aquela em que Rocky Lane dava voz ao cavalo falante chamado Mr. Ed. E Lubin teve a idéia de convidar Clint para o episódio “Mr. Ed Encontra Clint Eastwood”, episódio que foi ao ar em 22/4/1952, batendo o recorde de audiência da série. Da TV Clint foi filmar na Itália e o resto é história. Só que para Lubin essa história teve um final triste pois Clint Eastwood, após atingir a fama, passou a evitar seu protetor de todas as formas. Clint temia que Louella Parsons, Hedda Hopper e Sheyla Graham, as três maiores fofoqueiras de Hollywood viessem a prejudicar sua agora promissora carreira com intrigas comprometedoras. Clint até que tinha lá suas razões, mas bem que poderia por uma questão de justiça, ter sido grato a Lubin e acrescentado seu nome ao lado dos nomes de Leone e Siegel em “Os Imperdoáveis”.


22 de abril de 2011

QUEM É O PAI DE "MATAR OU MORRER"?



É bastante conhecido o dito popular “Filho feio não tem pai”. E a recíproca só pode ser verdadeira pois quando algum projeto dá certo, logo aparecem os muitos pais da idéia. Um filme, geralmente é uma obra coletiva, fruto do trabalho de diversos artesãos. Entre as principais pessoas envolvidas na produção de um filme estão o roteirista, o cinegrafista, o editor, o maestro ou o responsável pela trilha sonora e, claro, o diretor e os atores centrais. Sem esquecer do produtor que coloca o dinheiro e por isso também dá seus palpites. Se um filme decepciona, o culpado é sempre o diretor; mas quando o filme dá certo, todos lembram que ninguém é capaz de fazer um filme sozinho pois ele é um trabalho de equipe.

O EDITOR ELMO LINCOLN - Um dos melhores exemplos para ilustrar que “filho bonito tem muitos pais” é “Matar ou Morrer” (High Noon), uma das obras-primas do gênero western. Dirigido por Fred Zinnemann, não são poucos aqueles que levantaram dúvidas quanto ao diretor merecer os maiores créditos pela realização de um faroeste tão revolucionário. Ao longo de sua carreira, que começou como documentarista, o vienense Zinnemann sempre se mostrou um diretor meticuloso, que trabalhava excelentemente com os atores. No entanto, o fato é que Zinnemann nunca foi o que se pode chamar de ‘diretor de vanguarda’. Uma das invenções de “Matar ou Morrer’ é a sincronia entre a ação do filme e o tempo real. E Zinnemann, positivamente, jamais iria se preocupar com essa novidade técnica, que por sinal já havia sido utilizada em “Punhos de Campeão” (The Set-Up), 1949, de Robert Wise, estrelado por Robert Ryan. Após assistirem a primeira versão de “Matar ou Morrer”, nem Zinnemann e nem o produtor Stanley Kramer se mostraram satisfeitos com o que viram. Decidiram que o western deveria ser reeditado. Entra em cena, então, um outro pai de “Matar ou Morrer”, que é o editor Elmo Williams. O editor ignorou o fato de toda a ação do filme se passar entre 10h35 e terminar às 12h15, portanto com 100 minutos de duração. Williams editou o filme dinamicamente, deletando cenas inteiras e como resultado “Matar ou Morrer” ficou com 84 minutos, ou seja, 16 minutos a menos que o chamado tempo real que os tantos relógios em cena não cansam de exibir durante o filme todo. “Matar ou Morrer” resultou conciso e tornou-se modelo de edição de westerns. Sem exagero, este western é o “Cidadão Kane” do gênero, sem que Elmo Williams jamais reclamasse a paternidade de “Matar ou Morrer”. Outros fizeram isso por ele. Curiosamente, em nenhum outro trabalho de Elmo Williams como montador se percebe uma montagem tão perfeita como a de “Matar ou Morrer”.

A IMPORTÂNCIA DE CARL FOREMAN - O roteiro de “High Noon’ foi escrito por Carl Foreman e, como guardava algumas semelhanças com o conto “The Tin Star”, de autoria de John W. Cunningham (não confundir com o western de Anthony Mann, com Henry Fonda, que tem o mesmo título), o produtor Stanley Kramer decidiu comprar os direitos daquela história. Convém lembrar que Carl Foreman era comunista e seu nome era um dos mais especulados para ser colocado na Lista Negra de Hollywood e ele só estava trabalhando porque Stanley Kramer não se deixou intimidar pelas ameaças do Macarthismo. Quando estava sendo rodado “Matar ou Morrer”, Carl Foreman atuou como produtor associado do western e era quem estava o tempo todo no set de filmagens, as quais consumiram 28 dias na produção do filme. Enquanto isso Stanley Kramer, o produtor creditado, estava cuidando de outra produção sua que foi “A Morte de um Caixeiro Viajante”, com Fredric March. Isso significa que, além de roteirista, Foreman foi o faz-tudo por trás das câmeras de “Matar ou Morrer”. Quando o filme foi lançado, para sua surpresa, seu nome só constava como autor do roteiro e ainda, abaixo de seu nome estava o de John W. Cunningham, como autor da história. Carl Foreman não teve tempo para reclamar pois já estava de malas prontas para um longo exílio na Europa, onde prosseguiu sua carreira como roteirista, produtor e diretor. O documentário “The Darkness at High Noon : The Carl Foreman Documents”, de 2002, mostra uma carta que Carl Foreman teria escrito ao influente crítico Bosley Crowther, do jornal The New York Times, na qual dizia que Stanley Kramer lhe havia usurpado o crédito de produtor de “Matar ou Morrer”. A carta dizia ainda que ele, Foreman, havia tido uma participação decisiva na realização do western dirigido por Zinnemann, ao passo que Kramer se mostrara claramente indiferente ao filme, durante sua produção. Porém, depois do sucesso estrondoso de “Matar ou Morrer” e com Foreman distante, Stanley Kramer passou a posar como verdadeiro criador do filme.

MÚSICA E FOTOGRAFIA EXTRAORDINÁRIAS - “Matar ou Morrer” é o que se pode chamar de filme perfeito. Mas seria ele assim tão perfeito sem a cinematografia de Floyd Crosby (pai do cantor David Crosby, do grupo Crosby, Sills, Nash & Young)? Floyd Crosby possuía grande experiência em documentários, iniciando sua carreira em “Tabu”, de Murnau e Flaherty, em 1931. Esteve no Brasil em 1932 filmando “Matto Grosso”, na Floresta Amazônica. Migrou depois para o cinema comercial e foi o homem certo para dar o tom de documentário que Fred Zinnemann queria para “Matar ou Morrer”. Nenhum outro western em preto e branco jamais teve em sua cinematografia um elemento tão forte para ressaltar a essencial atmosfera de Haddleyville contida em “Matar ou Morrer”. E essa atmosfera foi completada pela música extraordinária de Dimitri Tiomkin, compositor que dispensa comentários mas que será eternamente lembrado por este filme. Tiomkin merecidamente recebeu o Oscar de Score Musical em 1952, superando a fortíssima concorrência de Miklós Rózsa (“Ivanhoé”), Max Steiner (“O Milagre de Fátima”) e Alex North (”Viva Zapata!”). E, como não poderia deixar de ser, Dimitri Tiomkin e Ned Washington receberam outro Oscar pela Melhor Canção com a clássica “Do Not Forsake Me, Oh My Darling”, que ficou mais conhecida por “High Noon”, cantada no filme por Tex Ritter, mas que deixou Frankie Laine muito mais rico com o milhão de cópias vendidas com sua interpretação.

UM CRIADOR DE HOMENS DE VERDADE - Muito já se escreveu (há até um livro de Pauline Kael) sobre o verdadeiro responsável por “Cidadão Kane”, que será eternamente obra do gênio de seu jovem diretor Orson Welles. A polêmica sobre “Matar ou Morrer” certamente continuará, mas ele nunca deixará de ser um filme de Fred Zinnemann. Gary Cooper era um dos anticomunista de Hollywood, sempre pronto para denunciar os desvios ideológicos dos vermelhos. Pois foi desse homem que Fred Zinnemann extraiu uma das mais pungentes interpretações que já se viu no cinema, como o homem isolado pela covardia de uma comunidade. Zinnemann com seus filmes sempre ressaltou a integridade moral inexpugnável de seus personagens como Thomas Moore (Paul Scofield) em “O Homem que Não Vendeu Sua Alma” e o soldado Robert E. Lee Prewitt, em “A Um passo da Eternidade”, dois exemplos admiráveis da criação artística do diretor vienense. Juntamente com Will Kane (Gary Cooper), essas personagens formam um conjunto grandioso de contribuição do cinema para a formação do ser humano, lição, infelizmente, difícil de ser aprendida. Por isso, se há um responsável maior por “Matar ou Morrer”, ainda que contando com o precioso trabalho coletivo que o cinema sempre exigiu, essa pessoa é Fred Zinnemann.

Fred Zinnemann entre Marlon Brando e Montgomery Clift

21 de abril de 2011

O HOMEM QUE LUTA SÓ (Ride Lonesome) - SCOTT, BOETTICHER E BURT KENNEDY JUNTOS OUTRA VEZ


BAZIN E OS MELHORES WESTERNS - Andrè Bazin surpreendeu o universo da crítica cinematográfica quando escreveu no Cahiers Du Cinemà, em 1957, que “Sete Homens Sem Destino” (Seven Men From Now), 1956, era um dos três melhores westerns do cinema, superado apenas por “Rastros de Ódio” (The Searchers) e por “O Preço de um Homem” (The Naked Spur). O celebrado crítico francês faleceu em 1958, sem ter visto os derradeiros westerns do trio Budd Boetticher-Burt Kennedy-Randolph Scott. Tivesse vivido para assistir “O Homem Que Luta Só” (Ride Lonesone), de 1959, escrito por Kennedy e dirigido e interpretado por Boetticher e Scott, que também eram os produtores e certamente Bazin ficaria numa situação desconfortável. Teria o crítico que aumentar de três para quatro seu leque dos melhores westerns com outro filme de Boetticher, pois “O Homem Que Luta Só” se situa no mesmo nível estético e psicológico do tão elogiado “Sete Homens Sem Destino”, assemelhando-se ao mesmo ainda na ação e no cenário. A diferença, se ela existe, chama-se Lee Marvin brilhante em “Sete Homens Sem.

A IMPORTÂNCIA DE BURT KENNEDY - Os faroestes da famosa série Boetticher-Scott são todos econômicos e relativamente curtos, mal passando dos 70 minutos de duração. O ponto alto desses westerns não é a ação, já que ela é quase sempre concentrada no final do filme, lembrando bastante os filmes em série para a TV, cujo desfecho de cada história semanal funcionava também como seu epílogo. Dos sete westerns da série, os cinco que merecem mais atenção são justamente aqueles escritos por Burt Kennedy, cujos pontos altos são os roteiros inteligentes, com frases impressivas e com situações que se alternam inesperadamente. Uma melhor observação denota que Burt Kennedy foi fortemente inspirado na criação de suas histórias pelos westerns de Anthony Mann estrelados por James Stewart. Isso pode ser percebido já no seu primeiro roteiro para o cinema, justamente “Sete Homens Sem Destino”, onde o tema constante da obsessiva vingança e da amoralidade se faz presente, o que também permeia os roteiros posteriores de Kennedy para a série com Randolph Scott e Boetticher.

OUTRA HISTÓRIA DE VINGANÇA - Em “O Homem Que Luta Só”, Ben Brigade (Scott) ex-sheriff de Santa Cruz prende o assassino Billy John (James Best), a quem deve conduzir até aquela cidade onde será julgado e enforcado. Brigade retarda sua caminhada até Santa Cruz para dar tempo para que o bandido Frank (Lee van Cleff), irmão de Billy, os alcance e possibilite o ajuste de contas entre ele Brigade e Frank. No trajeto até Santa Cruz encontram Sam Boone (Pernell Roberts) e Whit (James Coburn), foragidos da justiça que tencionam deixar de ser malfeitores, usando para isso a entrega do bandido Billy como se eles e não Brigade o tivessem capturado. Encontram também a senhora Carrie Lane (Karen Steele), cujo marido foi morto pelos índios. Para entregar Billy à justiça e serem anistiados de seus crimes, Boone e Whit precisam eliminar Brigade. A razão do ajuste de contas entre Brigade e Frank é que este havia enforcado a esposa de Brigade como forma de vingança. Frank teve que cumprir pena na prisão de Yuma depois de ser preso por Brigade. Quando afinal Frank se defronta com Brigade, acaba sendo morto por este. Surpreendentemente Brigade permite que Billy seja levado a Santa Cruz não por ele, mas sim pelos dois foras-da-lei que tencionam se recuperar aos olhos da Justiça. A cena final se passa exatamente onde está a árvore na qual Frank havia enforcado a esposa de Ben Brigade.

ROTEIRO DE AMBIGUIDADES - “O Homem Que Luta Só” foi filmado inteiramente em locações, a maior parte delas em Alabama Hills, que foi cenário também de “Sete Homens Sem Destino” e “O Resgate do Bandoleiro” (The Tall T). A memorável sequência final na qual Brigade vinga-se de Frank foi filmada em Lone Pine. O fato de não haver cenas de estúdio foi determinante para que a aridez de Alabama Hills desse maior autenticidade às ásperas conversas mantidas entre os personagens. O laconismo de Ben Brigade (Scott) com respostas secas transforma-o num ser amargo e obcecado pelo único propósito de sua vida. Quando Carrie Lane (Karen Steele) tenta percrustar seu interior ele lhe responde: “Dona, você sabe fazer um café como ninguém” e retira-se. Whit (James Coburn) e Boone (Pernell Roberts) conversam tão aberta quanto ambiguamente. E ambíguas são diversas situações de “O Homem Que Luta Só”, tão comuns nos cinco westerns roteirizados por Burt Kennedy. Em certo momento Whit segura o espelho para Boone se barbear enquanto Carrie exibe sua silhueta tentadora. Em outro momento Boone diz para o amigo que o quer como sócio no futuro, porque gosta muito dele, palavras estranhas para quem libidinosamente olha para Carrie. E mais uma vez o homem que quase sempre luta só (Randolph Scott) distancia-se da provocante mulher que desaparece com os amigos Whit e Boone. Solitário, Brigade vê queimar a árvore que serviu duas vezes de forca. Nenhum dos roteiros de Burt Kennedy posteriores aos feitos de encomenda para a série com Boetticher e Scott, tiveram igual dose de ambigüidade, solidão do herói ou obsessão por vingança. Muito pelo contrário, os roteiros de Kennedy foram marcados por muita ação e pelo tom alegre de comédia, o mesmo valendo para os western que dirigiu, sendo exemplos maiores “Gigantes em Luta” (The War Wagon) e as comédias “Uma Cidade Contra o Xerife” (Support Your Local Sheriff) e "Látigo, o Pistoleiro" (Support Your Local Gunfighter). Inequivocamente Burt Kennedy escreveu para a persona criada por Randolph Scott, persona essa, como já foi dito tantas vezes, evocativa dos personagens de William S. Hart.

ELENCO HETEROGÊNEO - “O Homem Que Luta Só” marcou a estréia de James Coburn no cinema e como Whit ele está longe do tipo sarcástico que marcaria sua presença na tela. Pernell Roberts, por sua vez é o próprio Adam Cartwright que personificaria por vários anos na série Bonanza: cínico e atrevido. Lee Van Cleff com bigodinho e chapéu que o Coronel Mortimer e Sabata usariam na sua fase de westerns Made-in-Italy. James Best mais uma vez exibe seu irritante cacoete de rir na hora errada, sua marca registrada que só funcionou bem quando ele virou o hilariante Sheriff Roscoe P. Coltrane na bem sucedida série The Dukes of Hazzard, feita para a TV. Excesso ainda maior em “O Homem Que Luta Só” é a figura de Karen Steele, inteiramente deslocada da atmosfera criada para o western. Sua cinturinha de pilão e seios de pin-up, lembrando Mamie Van Doren destoam do rigor formal do restante da produção. E assim como John Wayne era sempre John Wayne, Randolph Scott sempre personificou Randolph Scott nos seus westerns. Alguns deles clássicos como este “O Homem Que Luta Só”.

BURL IVES, ARREBATADOR EM "DA TERRA NASCEM OS HOMENS"


Um grande filme é composto de grandes sequências, o que não falta em “Da Terra Nascem os Homens” (The Big Country). Uma dessas, sequências, verdadeiramente inesquecível, fez com que as platéias ficassem arrebatadas com aquele pouco conhecido ator em cena. O nome dele era Burl Ives que adentra o resplandecente salão da casa principal da fazenda do adulado ‘major’ proprietário de terras interpretado por Charles Bickford, onde transcorre um elegante baile. Um a um os pares vão parando de dançar, assim como a música também silencia. Todos, então, olham para aquela homem rude, vestido com simplicidade e que com coragem e personalidade, fitando diretamente nos olhos o todo poderoso dono da casa, o afronta dizendo-lhe coisas que ele jamais esperava ouvir, especialmente dentro da sua própria casa. A atuação do rotundo ator valeu-lhe um Oscar como Melhor Ator Coadjuvante. Burl Ives estava com 49 anos e era um veterano do rádio, do teatro, da televisão e no cinema já havia feito meia dúzia de filmes.

Burle Icle Ivanhoe Ives nasceu em 1909, em Hunt City, Illinois e aos quatro anos fez, cantando, sua primeira apresentação pública. Mais tarde, demonstrando enorme talento para a música, aprendeu a tocar banjo, o qual só deixava de lado para atuar como fullback no time de football da universidade onde estudava. A música falou mais alto e aos 21 anos Burl tocava guitarra e cantava pelas ruas conhecidas canções folclóricas. Passou a cantar no rádio e a gravar folk songs, fazendo amizade com os famosos cantores folks Woody Guthrie e Pete Seeger. Em 1945 Burl Ives estreou no cinema interpretando um cowboy-cantor no filme “Smoky”, estrelado por Fred MacMurray. Em 1950, em seu quinto filme, Burl atuou no western “Serras Sangrentas” (Sierra), em que o mocinho foi Audie Murphy. Serras sangrentas eram as colinas de Hollywood, onde vivia-se o período mais negro da história do cinema norte-americano e o senador Joseph McCarthy comandava a odiosa caça às bruxas. Os suspeitos de simpatia pelo comunismo era convocados a depor na famosa comissão organizada pelo senado para expurgar o cinema dos inconvenientes que tinham ideologia diferente da permitida. A música folclórica, de aparente inocência, trazia subliminares mensagens sociais, isto quando não cantava diretamente o sofrimento que o capitalismo impunha ao povo menos afortunado. E Burl Ives foi convocado pela patrulha anticomunista. A princípio negou-se a relatar nomes de possíveis simpatizantes do comunismo, sendo então colocado na lista negra de Hollywood e impedido de atuar no cinema, do qual ficou longe por quase cinco anos. Diante das dificuldades que o cercaram, Burl Ives decidiu “cooperar” com o comitê, dando seu depoimento aos homens de McCarthy. Taxativamente disse que não era membro do Partido Comunista, mas que participou, juntamente com Pete Seeger de algumas reuniões com membros de sindicatos. Ives completou: “Vocês sabem quem meus amigos são. Se quiserem saber se eles são ou não comunistas, perguntem, a eles.” As bruxas estavam mesmo era atrás de Pete Seeger e, após o depoimento de Burl Ives, Seeger rompeu sua amizade com o amigo, que passou a considerar um delator. Todos os demais cantores de folk songs também romperam relações com Ives, para quem as portas do cinema se reabriram enquanto Seeger e outros ex-amigos se afastavam. 40 anos depois desses fatos, Burl Ives e Pete Seeger voltaram a cantar juntos num concerto beneficente em Nova York. Os anos da caça às bruxas eram apenas uma triste lembrança.

Enquanto esteve longe do cinema, Burl Ives passou a fazer teatro e impressionou os críticos e o público com sua criação como Big Daddy Pollitt na peça de Tennessee Williams intitulada “Gata em Teto de Zinco Quente”. Ainda na Broadway, Burl Ives participou de outro grande sucesso que foi a montagem de “Paint Your Wagon”, que seria levada ao cinema em 1969 com Lee Marvin e Clint Eastwood com o título de “Aventureiros do Ouro”. Burl Ives aproximou-se cada vez mais da música country, tornando-se um conhecido menestrel com seus 130 kg de peso e uma incomparável voz que fez dele um cantor de enorme sucesso. Gravou dezenas de discos e vendeu milhões de cópias de seus álbuns cujas canções abrangiam a maravilhosa vastidão da country-music. A música era a principal ocupação de Burl Ives que gravava e se apresentava incessantemente. Mas Burl retornou ao cinema em 1955 sob a direção de Elia Kazan (também acusado de delator) em “Vidas Amargas” (East of Eden), filme em atuava o jovem James Dean. Sua grande atuação nesse filme não passou despercebida a ninguém e o cantor-ator começou a receber cada vez mais convites para filmar, podendo até escolher os filmes em que queria atuar. Quando “Gata em Teto de Zinco Quente” foi levada para o cinema, Paul Newman e Elizabeth Taylor sabiam que teriam que enfrentar diante das câmeras um ator da envergadura (física e técnica) do grande Burl Ives. Em “Desejo”, ao lado de Sofia Loren, Burl Ives teve outra atuação não menos que magnífica como o pai que descobre que sua jovem esposa (Sofia Loren) o trai com seu próprio filho (Anthony Perkins). A seguir veio então “Da Terra Nascem os Homens”.
William Wyler sempre foi um excepcional diretor de atores. E Willy deu a Burl Ives a oportunidade de interpretar Rufus Hannassey, personagem com o qual pode extravassar todo seu imenso talento. A referida cena do baile é emblemática na carreira de Burl Ives pois todos os presentes naquele set de filmagem escutaram seu monólogo em profundo e respeitoso silêncio. Gregory Peck, Carroll Baker, Charlton Heston, Jean Smmons, Charles Bickford e mais duas dúzias de atores e outros tantos técnicos sabiam que estavam tendo a rara oportunidade de assistir a uma atuação merecedora de um Oscar, que de fato Burl Ives recebeu por essa interpretação. A seguir Ives atuou sob a direção de André De Toth e ao lado de Robert Ryan no excelente “A Quadrilha Maldita” (Day of the Outlaw). Depois de deixar sua marca indelével no cinema com os poucos filmes em que atuou, Burl Ives não encontrou mais filmes onde seu imenso corpanzil e talento ainda maior pudessem ter o merecido espaço. Continuou a trabalhar, no cinema e na TV, dos quais foi se afastando pouco a pouco para dedicar-se mais à música.

Burl Ives em vários momentos de "Da Terra Nascem os Homens".
Na foto abaixo entre Chuck Connors e Gregory Peck.

 No final de sua carreira Burl Ives havia gravado aproximadamente cem álbuns, alguns deles verdadeiramente clássicos. Ouvi-lo cantar "Juanita" ou recriar maravilhosamente "Mexicali Rose", dão uma amostra da arte desse incomparável abrdo. A voz melíflua de Burl Ives pode, ainda, ser ouvida em incontáveis narrações para documentários, mas nada que se comparasse à sua presença simpática no palco ou na TV. Apreciador inveterado de cachimbos e charutos, Burl Ives contraiu câncer na garganta e, após várias cirurugias, faleceu aos 85 anos, em 1995. Mas a cada vez que se revê "Da terra nascem os Homens" é impossível não se emocionar com o grande e inesquecível ator Burl Ives.

20 de abril de 2011

O COWBOY MONTGOMERY CLIFT EM "RIO VERMELHO"


Hollywood vivia o triste período da caça às bruxas comandada pelo senador Joseph McCarthy. Porém, anos antes, exatamente em 1944 foi criada na capital do cinema uma entidade de extrema direita denominada Motion Picture Alliance for Preservation of American Ideals. Essa organização visava defender a indústria cinematográfica contra a infiltração comunista. Faziam parte dessa entidade, entre outros, Gary Cooper, Ward Bond, Walt Disney, Ronald Reagan, a colunista Hedda Hopper, Robert Taylor, Walter Brennan e John Wayne. E o Duke foi eleito presidente da MPAPAI em 1949, justamente na época mais crítica do macarthismo. Nesse período de convulsão política do pós-guerra, Howard Hawks começou a filmar “Rio Vermelho” (Red River). O vermelho do título do filme não fazia nenhuma alusão ao comunismo, mas sim à passagem bíblica do Mar Vermelho. No elenco dois ferrenhos anticomunistas que eram John Wayne e Walter Brennan.

Em “Rio Vermelho” estreava no cinema um jovem ator de teatro chamado Montgomery Clift. Nascido em Omaha, Nebraska, em 1920 (mesma cidade onde nasceria Marlon Brando em 1924), Clift tinha várias afinidades com Brando: ambos trocaram a cidade natal por Nova York; ambos cursaram o famoso Actor’s Studio de Lee Strasberg; ambos transformaram-se nas maiores revelações da Broadway no pós-guerra; ambos eram cobiçados por Hollywood; ambos eram temperamentais; ambos eram liberais e, claro, ambos eram excepcionais atores. Howard Hawks assistiu a atuação de Montgomery Clift na peça “You Touched Me”, na Broadway, ficou impressionado com Monty e imediatamente o contratou para ser Matthew Garth, completando o elenco de “Rio Vermelho”. O salário de Clift no western de Hawks era de 60 mil dólares, enquanto o ator principal, exatamente o presidente da associação anticomunista de Hollywood, John Wayne (Thomas Dunson, no filme), receberia 150 mil dólares. Walter Brennan, grande amigo de Hawks havia sido contratado para o pequeno papel do cozinheiro Nadine Groot, com apenas três dias de filmagens. Depois de ver como Brennan deu vida ao cozinheiro, Hawks expandiu o papel e Groot ficou cozinhando até o fim da filmagem. Mal Hawks gritou “action” pela primeira vez teve início a série infindável de problemas com o elenco pois tanto Wayne como Brennan dificultavam o trabalho de Monty. Os dois radicais atores implicavam com os maneirismos do jovem ator durante as cenas, mas isso era de menos. Wayne e Brennan evitavam Montgomery de todas as maneiras pois não aceitavam sua disfarçada homossexualidade. Foi aí que Howard Hawks mostrou que sabia lidar tanto com egos incontroláveis como com comportamentos preconceituosos.

Com o passar das semanas Duke e Monty até passaram a conversar, sem se tornarem amigos de verdade. Brennan, por sua vez mostrou-se intransigente e manteve-se sempre distante de Clift. E todos sabem que nos filmes de Hawks prevalece o espírito de completa camaradagem. Certo dia Wayne e Brennan pediram a Hawks que despedisse John Ireland por suspeitar da amizade dele com Monty, ainda mais que em “Rio Vermelho” há uma cena de inegável simbolismo em que os dois atores medem o tamanho de seus... revólveres. Segundo diziam a arma de Ireland era uma das maiores de Hollywood. Não se pode esquecer que Hedda Hopper, temida por sua coluna de fofocas e intrigas era do grupo dos radicais de Hollywood. Tanta maldade impediu a turma da MPAPAI de perceber que John Ireland, estava mesmo de olho em Joanne Dru, com quem viria a casar-se em 1949. John Ireland interpretou Cherry (Cereja) Valance, personagem especialmente trabalhado pelo autor da história e roteirista Borden Chase porque seria vivido por Cary Grant. Cary que nunca fez um western em sua carreira, não aceitou atuar ao lado de John Wayne. Com a recusa de Cary Grant, o personagem de Cherry Valance foi bastante reduzido e ficamos a imaginar o trabalho que Hawks teria se o elenco tivesse os homófobos Wayne e Brennan de um lado e Monty e Cary Grant do outro.


Todos os problemas criados durante as filmagens de “Rio Vermelho” foram superados pela competência, paciência e psicologia de Howard Hawks. O diretor conseguiu transmitir confiança e segurança a Montgomery Clift, fazendo com que sua estréia cinematográfica fosse coroada de êxito, ainda mais se considerarmos que ele de cowboy não tinha nada e nunca havia montado na vida. Clift recusou dois importantes papéis que lhe foram oferecidos, após “Rio Vermelho”: o do pistoleiro Shane no western de George Stevens e o do sheriff Will Kane em “Matar ou Morrer”. Tivesse aceitado essas ofertas de trabalho Clift certamente seria lembrado por ter seu nome em alguns dos melhores westerns de todos os tempos. E Hawks gostou tanto de trabalhar com Montgomery Clift que ele foi a primeira opção para interpretar o bêbado Dude em “Onde Começa o Inferno” (Rio Bravo). Monty recusou o convite do diretor certamente porque sabia que trabalhar novamente com Wayne e Brennan seria, para ele, rever onde começa o inferno...